Seleção azzurra cruza o Atlântico de navio e volta para casa depois de dois jogos
Depois dos títulos mundiais de 1934 e 1938, além do ouro olímpico no futebol em 1936, a seleção italiana começou um período de seca de resultados. Mas na Copa de 1950, a primeira disputada no Brasil, houve motivos muito mais do que plausíveis para isso. No ano anterior, 1949, a Itália foi abalada por uma tragédia: o avião que trazia a delegação do Torino de volta de Lisboa, onde havia jogado um amistoso com o Benfica, chocou-se contra o muro de uma basílica na colina de Superga, em um dia de densa neblina em Turim. Morria um dos maiores times de todos os tempos, a base da seleção italiana. O trauma foi tão grande que a delegação que veio ao Mundial não quis viajar ao Brasil de avião: preferiu cruzar o Atlântico de navio. A seleção italiana da época tinha uma comissão técnica comandada por Ferruccio Novo, por sinal, também presidente do Torino.
A Itália, assim como Alemanha e Japão, forças do Eixo na Segunda Guerra, foram expulsas da Fifa. Mas a Itália havia conquistado as duas últimas Copas e foi logo perdoada. A Fifa tinha interesse que a azzurra fosse ao Brasil defender o título do qual era detentora. Seleções como Escócia, Índia e Turquia desistiram de viajar e o Mundial, em vez de 16 seleções, teve apenas 13. Reza também a lenda de que Ottorino Barassi, principal dirigente da Federação Italiana de Futebol, teria escondido a taça do mundo debaixo de sua cama, com medo que caísse em mãos nazistas. O troféu estava de posse transitória da Itália, que era a então campeã mundial antes de 1950. A mesma taça Jules Rimet, que veio definitivamente para o Brasil depois das conquistas mundiais de 1958- 1962-1970 e foi mais tarde roubada, em 1983.
A bordo da nave Sises de 16 mil toneladas, a Itália partiu de Nápoles em 4 de junho de 1950. A seleção fez uma escala em Las Palmas, nas Ilhas Canárias, e desembarcou no Rio de Janeiro 16 dias depois, exausta, mas recebida efusivamente por milhares de imigrantes italianos. Bem que a seleção tentou preparar-se para a Copa durante a viagem, mas havia muitas limitações:
— Levamos dois cestos de bolas, mas na chegada não tínhamos mais nenhuma. Caíram todas no mar. Alguns jogadores passaram mal durante a viagem. Os primeiros dias da viagem foram até divertidos. Conversar, comer, saber que iríamos a um campeonato do mundo. Mas não podíamos correr e fazer muita coisa. Eu me lembro que, se pulava corda, tocávamos a bola um pouquinho de cabeça. A preparação foi totalmente falha — contou Egisto Pandolfini, hoje com 88 anos, meia remanescente da aventura azzurra em entrevistas a televisões italianas. Na época jogador da Fiorentina, Pandolfini jogou pela seleção de 1950 a 1957, com 21 partidas e nove gols.
Condições precárias de treinamento durante a viagem de 16 dias
Para matar o tempo em mais de duas semanas no Sises, os jogadores brincavam, vestiam fantasias, jogavam cartas, mas, além do desgaste físico, havia também o desgaste mental. Foi o que se viu quando a Itália entrou em campo para enfrentar a Suécia. Inicialmente seria favorita, pois a equipe escandinava era formada por amadores. No entanto, as condições precárias de treinamento na viagem parecem ter falado mais alto em 25 de junho de 1950, quando a seleção estreou no Estádio Municipal do Pacaembu, em São Paulo. A Itália até fez 1 a 0 com Carapellese, aos 7 minutos de jogo. Jepsson empatou para a Suécia aos 25, e ainda no primeiro tempo os escandinavos passaram à frente por meio de Andersson, aos 33. Novamente Jeppson, aos 23 do segundo tempo, fez 3 a 1 para os suecos. Muccinelli diminuiu para a Itália aos 30, mas não foi suficiente para evitar a derrota.
A azzurra entrou em campo para enfrentar o Paraguai no segundo jogo, em 2 de julho, novamente no Pacaembu, já eliminada. Como a Suécia havia empatado com os paraguaios em 2 a 2, os escandinavos garantiram o primeiro lugar no grupo e consequentemente a classificação para o quadrangular final com Brasil, Uruguai e Espanha. Mas pelo menos a Itália teve uma despedida honrosa da Copa, depois de disputar apenas duas partidas: venceu o Paraguai por 2 a 0, gols de Carapellese, aos 12 minutos do primeiro tempo, e de Pandolfini, aos 17 do segundo.
Se para a Itália a participação em 1950 foi modesta, para o Brasil ficou marcada como a maior tragédia da história do seu futebol com a derrota para o Uruguai por 2 a 1 na final de 16 de julho no Maracanã. Um fantasma que o Brasil tenta exorcizar para conquistar a taça no dia 13 de julho de 2014, no mesmo local.