Recém-casado no Rio de Janeiro, conde de Monza conta como vê o atual panorama artístico e revela detalhes sobre o casamento que faz com que pela primeira vez um brasileiro entre para o Livro de Ouro da Nobreza Europeia
Os príncipes não existem apenas nos contos de fadas. Embora não aconteça todos os dias a possibilidade de conversar com um deles na vida real, Comunità entrevistou o príncipe de Fabbrica, Giulio Durini di Monza. Além de ser um renomado pintor e artista plástico, é profundo conhecedor das artes e escolheu o Brasil como sua segunda residência para morar com o seu cônjuge, o brasileiro Henrique Mollica, com quem se casou no início de agosto, na capital fluminense.
Nascido em Milão, o conde de Monza é herdeiro de uma das famílias mais antigas da Lombardia, os condes Durini de Monza. Já viveu em Nova York, onde se formou pela New York Academy, fundada por Andy Warhol; Paris; Madrid e Londres. Atualmente, se divide entre São Paulo e Milão, onde preside a Fundação Durini, criada em 1939 pelo seu tio-avô, Antonio Durini, em homenagem ao seu pai, o pintor Alessandro Durini.
Há muitos anos, Giulio Durini di Monza se dedica à recuperação e à revitalização da sede histórica da Fundação Durini, o Palazzo Durini, além de cuidar pessoalmente da programação das manifestações institucionais do único palácio da família aberto ao público. Foi ele o responsável pelo renascimento da Fundação e, desde 2001, ocupa o cargo de presidente. O palácio do século XVIII sempre teve a arte como protagonista: entre 1809 e 1815, serviu de residência do renomado pintor e teórico de arte Giuseppe Bossi, e também foi o ateliê do escultor Antonio Canova durante a sua estadia em Milão.
A família Durini, além de colecionar obras de arte, preserva relíquias, como a Coroa Férrea, que pertenceu à rainha Teodolinda e foi utilizada até o século XIX para a coroação do rei da Itália. Dentro da coroa, composta por seis retângulos de ouro e adornada com pedras preciosas, há uma placa circular de metal que, segundo a tradição, foi forjada a partir do ferro de um dos pregos usados na crucificação de Jesus.
A coroação mais famosa em que foi usada a relíquia foi a de Napoleão Bonaparte em 1805, na ocasião em que se coroou rei da Itália na Catedral de Milão. O episódio se tornou famoso, pois, enquanto ele colocava a coroa na cabeça, afirmou “Recebi-a de Deus, que ninguém ouse tocá-la!”. A relíquia está guardada na Catedral de Monza e pode ser visitada duas vezes por dia.
Entre os membros da nobre família Durini, havia bispos, governadores, prefeitos, cardeais, músicos e artistas que ajudaram a escrever a história de Milão desde 1644. O conde Giulio diz que as suas origens nobres nunca foram um problema para ele, e que não as considera nem uma vantagem nem uma desvantagem.
Fundação Durini abriga exposições em Milão e financia jovens talentos artísticos e musicais
O príncipe de Fabbrica sempre foi apaixonado pela arte e desde cedo seguiu o mesmo caminho de Alessandro Durini, tornando-se pintor.
— A minha paixão pela arte e pela cultura começou muito cedo, quando eu era criança, certamente influenciado por um ambiente cercado de obras de arte. Sempre vivemos em casas históricas cheias de pinturas, esculturas, móveis finos e objetos de todos os tipos — conta o nobre italiano, que pinta imensas telas a óleo tão ricas em detalhes que parecem fotos.
Os seus quadros de nus masculinos, longe de conterem qualquer carga de obsceno, evocam um erotismo natural com um realismo audaz e sensual. O conde revela que a inspiração vem da qualidade pictórica dos antigos mestres e também da linguagem expressiva contemporânea. O artista milanês cria uma pintura sem tempo, antiga nas formas, porém, simultaneamente, apresenta um olhar totalmente contemporâneo, que encontra no corpo a melhor representação.
Além de pintor, o príncipe Giulio é um dos retratistas oficiais do Senado da República italiana.
— É realmente um trabalho muito interessante ser retratista, pois é possível conhecer diferentes personalidades. Com certeza, a mais interessante que conheci foi o do presidente Francesco Cossiga. Fiz um retrato de corpo inteiro. Ele queria que o seu quadro fosse maior do que dos outros presidentes, pois ele foi o único político italiano que ocupou todos os cargos do Estado — revela o príncipe recém-chegado a Milão após uma estadia no Rio.
Como presidente da Fundação Durini, o príncipe se ocupa da programação cultural do Palácio Durini e da conservação do grande acervo de obras de artes abrigado no prédio e, além disso, investe recursos para incentivar os jovens artistas plásticos de talentos e estudantes do Conservatório de Música Giuseppe Verdi de Milão com bolsas de estudos.
— Eu vejo que o panorama artístico está mal na Itália como no resto do mundo. Infelizmente, a arte agora é muito ligada ao mercado e se tornou cada vez mais um produto comercial, pois falta a qualidade e os artistas, se assim podemos chamá-los, são ignorantes e vítimas da moda à procura de satisfazer para vender — analisa o artista de 48 anos.
Mas, de acordo com ele, a cena contemporânea musical é mais promissora.
— Os jovens seguem disciplinas duríssimas e não podem escapar delas. Sem técnica não é possível tocar um instrumento. O jovem músico deve conhecer bem o seu trabalho; não pode abandonar-se a delírios conceituais, ao contrário dos artistas plásticos que pensam que a ideia é suficiente para criar uma obra de arte e não importa a execução — critica o pintor que no ano passado participou da Bienal de Veneza no pavilhão da República Árabe da Síria.
Brasil, país aberto, com
uma natureza inspiradora
Giulio Durini di Monza vive em contínuo movimento e se divide entre dois hemisférios: o norte do Belpaese e o sul do país tupiniquim.
— Gosto muito da natureza do Brasil, que também me atrai por ser um país onde ainda há muitas coisas para se fazer, sobretudo no mundo da cultura, que, na verdade, é um pouco carente, especialmente nas artes plásticas — afirma o conde, que escolheu a Baía de Guanabara como cenário para celebrar a união civil com o carioca Henrique Mollica, no dia 3 de agosto.
O casal se conheceu há três anos durante uma festa na casa de amigos de Mollica na Europa e oficializaram a união com uma cerimônia intimista em uma mansão no bairro carioca da Glória. Na Itália, não é permitido o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Segundo o príncipe Giulio, qualquer país é mais aberto que a Itália, “pois esse tipo de união é já possível em quase todos os países da Europa”. O casamento teve muita repercussão na imprensa brasileira, que ressaltou o fato de Mollica passar a ter os mesmo títulos de nobreza do conde de Monza e ser o primeiro brasileiro a entrar para o Livro de Ouro da Nobreza Europeia.
O príncipe Durini relata que na Itália a notícia não foi divulgada porque ninguém sabia. No entanto, o Giornale di Monza publicou uma longa matéria em 23 de setembro intitulada “o conde de Monza se casa no Rio com um brasileiro”.
— Isso é o cúmulo, pois desde o fim do sistema feudal o Giornale di Monza não publica uma matéria sobre o casamento de um dos seus feudatários. Então, com um ato novo e incomum para a Itália, provocamos uma notícia que poderia ter sido escrita há dois séculos. O meu irmão casou-se com a neta do imperador da Pérsia e o jornal não escreveu nada, enquanto eu me casei com um homem e Monza fala sobre isso. Talvez haja muito interesse sobre esse assunto… — desabafa o conde.