Após muita pressão, o Parlamento italiano decidiu discutir o projeto de lei para legalizar a eutanásia no país. No início de março, as comissões de Assuntos Sociais e Justiça iniciaram a discussão sobre as quatro propostas de lei e examinaram os textos. Nas audiências, especialistas falaram sobre os aspectos bioéticos acerca do tema. A proposta se concentra nos artigos 3, 13 e 32 da Constituição italiana e esclarece os direitos dos cidadãos sobre a recusa no início ou durante a continuação do tratamento médico, e as formas de se expressarem, mas também as consequências para os profissionais de saúde no caso de descumprimento das normas ou da vontade dos pacientes.
A iniciativa acontece após mais um caso comovente, ocorrido em dezembro do ano passado, protagonizado por Domique Velati. Militante radical, natural de Bolonha, tinha 59 anos. Diagnosticada com um câncer de cólon, conseguiu realizar o procedimento de suicídio assistido em Berna, na Suíça. No dia 15 de dezembro, tornou-se a primeira pessoa a receber ajuda financeira e logística para realizar o procedimento.
Membro do Partito Radicale Transnazionale e ex-membro do parlamento europeu, Marco Cappato é promotor da campanha Eutanasia Legale e, juntamente com a Associazione Luca Coscioni e instituições como UAAR, Exit Italia e Amici di Eleonora lançou a campanha para o recolhimento de assinaturas para discutir a proposta de lei de iniciativa popular pela legalização da eutanásia e pelo pleno reconhecimento do testamento biológico. No dia 13 de setembro de 2013, a proposta de lei foi entregue à Câmara, contendo 67 mil assinaturas.
Em conversa com a Comunità, Cappato defendeu a necessidade de o país debater o assunto.
— O problema não é ser a favor ou contra a eutanásia, e sim escolher entre a eutanásia clandestina e a eutanásia legal. Os pacientes, os médicos e os familiares devem ter a garantia de boas regras, fundadas no princípio da liberdade e da responsabilidade individual. Pedimos apenas isso: que qualquer um seja livre para decidir sobre sua própria vida, assim como pela própria morte — esclareceu Cappato.
A morte de Velati lembrou o caso de Eluana Englaro, que entrou em coma após um acidente de carro em janeiro de 1992 e suscitou intenso debate entre os defensores e opositores da prática. Logo após o acidente, ela passou a ser alimentada através de tubos, mas seu pai, Beppino Englaro, lutou para que o procedimento fosse suspenso. O caso foi debatido na Justiça e o pai de Eluana perdeu, em 1999, na Corte de Apelação de Milão, e voltou a perder a causa, em 2005, na Corte de Cassação. Em de julho de 2008, a Corte de Apelação de Milão voltou a se pronunciar, desta vez dando ganho de causa a Beppino. Em fevereiro de 2009, Eluana foi transferida para um hospital particular em Udine, onde uma equipe médica suspendeu o tratamento. Nos dias que se seguiram, o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi emitiu um decreto que obrigava a continuação do tratamento de Eluana, porém o presidente da República Giorgio Napolitano se recusou a promulgar o decreto. Eluana viria a falecer três dias após ter o tratamento suspenso.
Entre os casos de Eluana Englaro e Domique Velati, passaram-se sete anos de silêncio sobre o tema. Perguntado sobre a razão de tamanha dificuldade de se discutir a eutanásia na Itália, Cappato responde.
— Porque não há informações. Todas as sondagens confirmam que 60% (fonte Eurispes) dos italianos estão de acordo com nossa proposta, mas nestes sete anos jamais houve um debate sério na televisão. Em 31 anos, jamais o Parlamento havia tido a coragem de falar sobre este assunto, mas não nos iludamos. A primeira resposta foi apresentada pelo socialista e radical Loris Fortuna, em 1984. Vão fazer de tudo para jogar areia em nossa proposta de lei de iniciativa popular, apresentada em 2013 — prevê Cappato.