A filosofia de Umbelino Frisão

Acima das letras e mestre das nações
Não me aventuro a estudar o pensamento do marquês Umbelino Frisão (1931-2015), cuja bibliografia ultrapassa a casa do milhar, entre livros, ensaios e artigos que lhe foram dedicados. Impressiona como as novas gerações encontram em Umbelino não apenas uma bandeira, mas uma fonte de inspiração, um incessante repertório para responder aos desafios da crise de paradigmas, que nos circunscreve.
Também me incluo, modestamente, na legião de seus discípulos. Decidi levar a termo a compilação dos volumes que formam a biblioteca do velho solar de Cruz de Celas. A faixa temporal dos volumes salta aos olhos. Sobretudo aqueles mais recentes, sublinhados e anotados, como de costume, embora trêmula e incerta a caligrafia do provecto leitor. Prova que Umbelino permaneceu lúcido até o fim.
Subsistem questões insolúveis no seu índice livresco, tamanha a diversidade crítica do conjunto, a beleza e a raridade das peças, bem como os volumes ausentes, aqueles que se tresmalharam nas múltiplas mudanças que realizou.
Faço uma pequena cronologia de seus últimos anos de vida. Em 2008, figura nas listas do Nobel e transforma o palácio em centro cultural. Dois anos depois, Umberto Eco declara em sua Bustina di Minerva: “só escrevi O nome da rosa após a leitura do Diadema da idade média de Umbelino Frisão”. Em 2013, Thaïs Massenet edita Analecta umbeliniana: seleção de pensamentos urânios. Já a prestigiosa editora Jacques Vrin imprime, em 2014, a obra completa prefaciada por Michel Verdurier, Filosofia oblíqua: princípios de naufrágio transcendental.
Umbelino Frisão morreu no dia 27 de novembro de 2014, às cinco e trinta e sete da manhã, de causas naturais, assistido por Ulrika Werner e Cláudio Sevandijas. Suas últimas palavras foram: Urânia, mehr Wasser!, ou em bom português “Urânia, mais água!”
Sepultado com honras oficiais no Mosteiro dos Jerônimos, Mario Soares discursa, emocionado, e assim conclui: “Umbelino, Camões e Fernando Pessoa formam a sublime trindade portuguesa. Descanse em paz, mestre das nações”.
Uma pena constatar, afinal, que o marquês Umbelino Frisão jamais existiu!
(trecho de livro inédito assinado por Lúcio Marchesi)