Viram aqueles belíssimos figurinos das cerimônias de abertura e encerramento da Olimpíada e Paralimpíada de 2016? A romana Silvia Aymonino, de 52 anos, morou cerca de um ano no Rio para preparar tudo e dar um colorido especial às festas no Maracanã. Ela já tinha trabalhado, cerca de 15 anos atrás, no Theatro Municipal carioca, na ópera Norma. Por sinal, os espetáculos líricos são a especialidade dessa figurinista. Trabalhou por muitos anos na alfaiataria Tirelli, referência na Itália e no mundo no campo dos espetáculos.
O também italiano Marco Balich, diretor da cerimônia no Rio, já a conhecia quando chamou Silvia para ajudá-lo na Olimpíada de Inverno de Turim, em 2006. Ela emprestou seu talento num pedacinho da festa de encerramento dos Jogos de Londres, nos 10 minutos da passagem da bandeira olímpica da capital britânica para o Rio. Depois, esteve ao lado de Balich na Olimpíada de Inverno de Sochi, Rússia, em 2014. No Rio, Silvia teve outros conterrâneos trabalhando em equipe: Lior Ozan, Marco Idini, Caterina Botticelli e Francesca Maggiore, além da ítalo-brasileira Giulia Cauti.
— O Rio foi minha quarta Olimpíada. Mas não continuo a considerar esse o meu trabalho. É o algo a mais que eu posso dar. Olimpíada é diferente do espetáculo. É preciso ser mais tolerante se pretendemos dar o máximo como em tudo o que fazemos, nós, italianos. É preciso colocar junto pessoas diferentes. Não é como ter uma fábrica. É uma coisa sentimental — revela Silvia à Comunità.
No total foram mais de 12 mil figurinos, dos quais 5.500 na abertura, três mil no encerramento, mais 2.500 e 1.500 nas duas cerimônias paralímpicas. Semelhanças e diferenças. Italianos e brasileiros, experiência e convivência às vezes difícil, mas enriquecedora, segundo a figurinista.
— Não fizemos a parte do Carnaval do encerramento da Olimpíada, que ficou a cargo do barracão da Rosa Magalhães, especialista na matéria. Da Itália, trouxemos a capacidade de reconhecer-se nos produtos. Não sei se o italiano tem mais ou menos capacidade. Mas não dá o braço a torcer até que se faça como tem de ser feito. No produto que entrega tem o seu nome, o da sua família, o senso do justo, do belo. O mais importante que trouxemos foi o olho. Os brasileiros sabem fazer muito bem várias coisas que não conhecemos, como o Carnaval, além de materiais tecnológicos inexistentes na Itália. Mas o italiano tem um olho a mais para ver se podia chegar ao máximo, cuidar dos detalhes, do material. Não se contenta. Cada pessoa é uma pessoa, mesmo os italianos são assim.
Foi uma belíssima experiência trabalhar no Brasil, assegura a romana.
— É muito difícil considerar os brasileiros um grupo, aproximar-se deles com regras comuns. É preciso encontrar em cada um deles um compromisso, ser flexível. Usei todos os meus conhecimentos para entender os brasileiros e, no fim, os acho parecidos com os sicilianos. São calorosos e desconfiados, evitam o confronto direto. Estranham como nós, italianos, gritamos uns com os outros e cinco minutos depois vamos juntos para o bar. Mas se pode trabalhar no Brasil com imensa variedade de diversidade. Essa é uma riqueza enorme.
Fantasias são “compreendidas” com as mãos pelos atletas paralímpicos cegos
Em Roma, cidade que ela acha parecida com o Rio, ela é considerada uma suíça por ser pontual. Silvia, cujos pais são do Vêneto e do Piemonte, confessa que adora a Paralimpíada:
— Nela, o espirito olímpico se demonstra mais intacto. É a mais emocionante forma de diversidade para mim, embora para as pessoas com deficiências seja o quotidiano. Os figurinos são feitos para todos, o que eles apreciam. Se você oferece ajuda para se vestirem, se ofendem bastante. Os locais de provas são aparelhados também para isso, os camarins, os bancos, os colchões, se podem adaptar. Os cegos, de costume, são os únicos que vêm com algum acompanhante. Em Sochi, eu tinha desenhado um figurino feito por dois pedaços de tecido com um deles cortado com laser em relevo. Foi muito emocionante. Uma senhora cega começou a tocá-lo, conseguia entender o desenho e chegou às lágrimas porque tinha sido feito um figurino para uma pessoa que não o via, mas podia senti-lo. Aqui no Rio também me agradou fazer peças que podem ser “entendidas” com as mãos — revela Silvia, mãe de dois filhos adultos e casada com o diretor de ópera Lorenzo Mariani.