Os esqueletos industriais da cidade conhecida como leonessa d’Italia estão com os dias contados: um projeto de revitalização urbana de 45,6 milhões de euros prevê áreas verdes, parques, complexos residenciais, museu e teatro infantil

A cidade a 120 km de Milão, bem servida de trens e vias expressas, dá um passo rumo à recuperação de uma inteira zona abandonada, adjacente ao centro histórico, onde as ruínas compõem um cenário fantasmagórico dentro da paisagem urbana. As velhas fábricas darão lugar a complexos residenciais, instalações culturais e prédios de escritórios. O plano faz parte do projeto “Além da Rua” e vai custar quase 50 milhões de euros. O local fica em torno da Via Milano, um nome que remete à capital da Lombardia — concorrente da velha Leoa da Itália, como Brescia é conhecida — que volta a rugir como nos bons tempos.
— Temos visto casais de italianos na faixa dos 30 anos que estão voltando para cá. Este é um bom sinal de esperança no futuro — afirma o prefeito Emilio Del Buono à Comunità durante a visita do urbanista e político italiano Stefano Boeri, um dos maiores arquitetos do mundo.
O autor do premiado Bosque Vertical veio a convite do projeto Old Cinema, que coloca em discussão a revitalização de cinemas históricos e propõe a inovação como catalizadora de uma nova política voltada para a arte e a cultura.
— Brescia é um pedaço importante de um grande arquipélago urbano que está nascendo na Lombardia. Milão é um deles mas não é o único. Serve uma lógica de colaboração e não de competição. Esta é uma zona que sofre algumas consequências da pós-industrialização, com o fim de uma era, e o consequente abandono de grandes estruturas. Elas são resíduos do século XIX e existem em toda a Europa — afirma Stefano Boeri à Comunità, em uma das paradas ao longo do percurso pela ruas Giulio Quinto Stefana e Milano.

Projeto prevê a criação de um trem metropolitano
Urbanistas, arquitetos e políticos juntam esforços em busca de uma solução que torne a cidade mais atraente, principalmente para os jovens.
— Aprovamos o projeto executivo que vai provocar uma grande reformulação aqui e nesta zona vai nascer um teatro para crianças. Prevemos ainda aquisição e a demolição de um prédio para dar lugar a um parque, além da mudança de mobilidade. Em um trecho, a ferrovia vai virar um trem metropolitano — diz o prefeito Emilio Del Buono.
É necessária uma visão do todo, algo que apenas a administração pública pode ter ou dar, ressalta Boeri.
— Depois deve ter o envolvimento dos recursos de todos os potenciais operadores privados, de quaisquer tipologias. Este tema Brescia está trabalhando bem. Acho importante que estas zonas não se transformem em ilhas. Brescia é uma parte de um grande mosaico metropolitano — completa Boeri, professor de Projetos Urbanísticos do Politécnico de Milão.
A conexão com outras partes da cidade é fundamental. O sistema intermodal prevê o acesso ao coração de Brescia através de um trem metropolitano que atenda à mobilidade sustentável. O sistema Brescia Mobilità já transporta anualmente 15 milhões de passageiros no metrô e nas linhas urbanas de ônibus.
O professor sabe bem o que diz e com conhecimento de causa dá conselhos ao prefeito local. Depois de 18 meses como secretário municipal da Cultura, durante o governo de Giuseppe Pisapia, em Milão, entre 2011 e 2012, o “político” Stefano Boeri propõe a criação de uma agência mista de desenvolvimento, público-privada, mas com a maioria pública, com uma voz de comando que se responsabilize pela evolução do projeto. Sinergia absoluta significa economia de tempo e de recursos. O plano de requalificação vai se estender por um quinquênio e vale 45,6 milhões de euros, sendo 17,9 a “fundo perdido” do governo, 14 dos agentes privados e 7,1 do município.
A estrela polar do projeto deve contemplar a harmonia entre o coworking e a social housing, já prevista no velho Borgo San Giacomo. Outro fator importante é a área verde. Um grande parque vai surgir na ex-zona industrial da Caffaro, cuja requalificação vai custar 30 milhões de euros aos fundos estrtuturais europeus, que serão usados pela multinacional americana AECOM. Onde antes os operários montavam os climatizadores da Ideal Clima, a associação Telaio vai construir um anfiteatro com 200 lugares, com quadras esportivas e laboratórios técnicos de ensino. Enfim, uma revolução urbana, sem consumo do solo, dá o norte para a Brescia do futuro que honra o passado. Ali também nascerá o Museu da Indústria e do Trabalho, uma justa homenagem à cidade mais industrializada da Europa.