Comunità Italiana

Fora dos padrões

{mosimage}Coleções de obras dos irmãos Campana chegam ao CCBB do Rio, com design que brinca com funcionalidade e não segue padrões estéticos

Uma simples peça do mobiliário pode virar uma obra de arte se lhe forem atribuídos elementos diferentes e ousados. O trabalho de desconstrução e remontagem de objetos, utilizando materiais incomuns e impensados no design de móveis, são características marcantes dos irmãos ítalo-brasileiros Fernando e Humberto Campana. A dupla ignora o formato tradicional das peças e cria novas funções para os objetos do cotidiano. Humberto é artesão e Fernando participa das criações como arquiteto. O reconhecimento internacional das obras desses dois brasileiros aconteceu através da organização da primeira grande retrospectiva de seus trabalhos, feito pelo conceituado Vitra Design Museum, da Alemanha, com curadoria de Mathias Schwartz-Clauss. A mostra intitulada Anticorpos chegou ao Brasil e conta com 200 obras desenvolvidas no período de 1989 a 2009. A exposição, que integra a agenda de eventos do Momento Itália-Brasil, já passou por museus europeus e centros culturais do Espírito Santo, Brasília e São Paulo. Atualmente pode ser conferida até 6 de maio, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro.

A mostra traz um panorama histórico dos trabalhos dos Campana relacionados às artes plásticas, peças de mobiliário e joias. De acordo com o curador da exposição, Mathias Schwartz-Clauss, através de diferentes cores, formas e materiais, o público vai poder apreciar um design com características bem brasileiras, que utiliza materiais típicos do país, como fios emaranhados, algodão, plástico, cobre, retalhos coloridos e estampas em formas exuberantes.

— A rica linguagem visual dos Campana está firmemente ancorada em sua terra natal, o Brasil, país que reflete o protótipo típico de nossa época globalizada. A exuberância de sua natureza, a mistura de seu povo e a justaposição não mediada de ricos e pobres proporcionam o solo fértil onde crescem os contrastes de cores, formas e materiais — ressalta o curador.

A retrospectiva apresenta a maior parte do acervo da dupla, incluindo coleções particulares, institucionais e a coleção Estúdio Campana. A mostra Anticorpos é dividida em nove módulos: Fragmentos, Objetos Trouvés, Nós, Varetas, Híbridos, Planos Flexionados, Objetos de Papel, Agrupamentos, e Orgânicos. Na série Fragmentos, a grande atração é a poltrona Favela, de 1991, símbolo de improvisação. Na seção Varetas, os irmãos construíram objetos com feixes de varetas que parecem refletir o caos artificial criado pelo homem. Na ala Transplásticos, inserida na coleção Híbridos, de 2007, os irmãos entrelaçam vime com materiais inusitados. Já na seção Objetos de Papel, eles desenvolvem peças que podem ser produzidas industrialmente a partir de papel reciclado. Peças tridimensionais feitas a partir de experimentações com papel machê e colagens com variadas temáticas também foram confeccionadas especialmente para a exposição.

— Os objetos do acervo pessoal da dupla, espalhados ao longo da exposição, fornecem insights intimistas, surpreendentes e bem-humorados sobre a vida de Fernando e Humberto Campana — conta Mathias Schwartz-Clauss.

Os artistas entendem o design como uma apropriação cultural de múltiplas influências e alegam que várias tentativas criativas são necessárias até se chegar ao objeto finalizado.

— Muito dos métodos de trabalho vêm das descobertas, dos erros. Materializar o erro é o mais difícil. As obras beiram o acaso, mas têm engenharia — ressalta Fernando Campana.

Os Campana privilegiam o conceito artístico de uma maneira mais parecida com o surrealismo. Uma das técnicas recorrentes dos irmãos é retirar, de seu contexto original, materiais manufaturados, e agrupá-los, para criar uma nova forma a partir disso. A dupla trabalha também com a justaposição de materiais orgânicos e inorgânicos, naturais e industriais, quentes e frios. Schwartz-Clauss afirma que Fernando e Humberto não seguem padrões estéticos.

— Eles ignoram todas as convenções do design tradicional, brincam com a noção de funcionalidade e formam seus objetos poéticos a partir de realidades contraditórias — conclui.