“Particularmente, devo a Gianni Ratto o que de melhor eu pude alcançar como atriz”
Gianni Ratto e o teatro brasileiro
O Rio foi palco da modernização do teatro brasileiro, para a qual os artistas italianos do pós-guerra contribuíram de maneira fundamental
Fernanda Montenegro
Nesses 450 anos de sua história, o Rio nunca prescindiu da cultura italiana. Nem poderia. A cidade nasceu no período glorioso da Renascença. Há relatos da influência italiana na música, na arquitetura e nas artes cênicas. No desenvolvimento da nossa vida cultural, principalmente a partir do século XIX, a Itália nunca esteve ausente. Inclusive pela sua absoluta importância.
Na geração do pós-guerra, que é a minha, na minha área, toda uma frente de jovens diretores de teatro, italianos, veio para o Brasil: Ruggero Jacobbi, Adolfo Celi, Bolini,D’Aversa, Luciano Salce e Gianni Ratto.
Gianni Ratto foi um dos fundadores da Cia “Piccolo Theatro de Milão” e durante 10 anos seu cenógrafo-chefe. Era o fim de uma guerra insana. A Europa desunida. Eles vieram em busca de novas oportunidades. Com eles o teatro brasileiro se modernizou.
Deve-se também a esse grupo de encenadores italianos a formação de diretores brasileiros. Essa frente de homens de teatro se formou, quase toda, na Academia de Silvio D’Amico. Portanto, tinham método, disciplina e sólida cultura. E essa estrutura eles transmitiram a toda essa geração à qual pertenço.
Quero me restringir, porém, à minha experiência, porque eu me formei tendo muitos deles como diretores e também assistindo a espetáculos de outros grupos conduzidos por eles. Destaco, porém, a figura do Gianni Ratto. Formamos, com ele, a companhia: “O Teatro dos 7”. Desse grupo faziam parte: Ratto, Fernando Torres, Ítalo Rossi, Sergio Britto e eu. “O Teatro dos 7” obteve, durante seis anos, de 1959 a 1964, um imenso sucesso pela alta qualidade do repertório, pelo apuro técnico e pela excelência do elenco.
Com a presença desses italianos entre nós, o teatro brasileiro alcançou uma universalização cênica sem jamais excluir, porém, a nossa brasilidade e o nosso temperamento. Esse sempre foi um propósito jamais descuidado por esses criadores. Jamais quiseram nos europeizar.
Alguns desses “irmãos de fé” voltaram para a Itália. Gianni Ratto e D’Aversa permaneceram e aqui deixaram sua marca criadora. Aqui viveram e aqui estão enterrados. Foram e são vidas entregues ao teatro do nosso país. Só nos engrandeceram. Particularmente, devo a Gianni Ratto o que de melhor eu pude alcançar como atriz.
O Rio é o centro irradiador da nossa cultura. A propósito dos 450 anos da sua fundação, ao lembrar a influência italiana nos nossos palcos, neste pequeno artigo, como atriz brasileira de origem também italiana, como emblema, destaco com imensa gratidão a figura desse amigo, encenador, professor e, acima de tudo, verdadeiro artista: o italiano Gianni Ratto.