Juiz de Fora não é apenas a Manchester mineira por causa da indústria têxtil. Também tem alguma história de imigração italiana, que foi tema até de tese de mestrado. Rafael Bertante, pesquisador e descendente de italianos, conversou sobre sua família e a cidade com o repórter Maurício Cannone.
A família Bertante não foi direto para Juiz de Fora. Desembarcou em Santos em 1891. Alguns continuaram no estado de São Paulo, outros foram para Minas. Depois de pesquisar e consultar especialistas, Rafael descobriu mais detalhes sobre a origem dos ancestrais para revelar à Comunità. Em conversa com o escritor Alessandro Bertante, soube que a família tem origem no Vêneto.
— O município é Costa di Rovigo, na província de Rovigo. Ainda se encontram Bertantes por lá. Meu trisavô Ettore veio para o Brasil com a esposa e quatro crianças. Conseguimos alguma documentação sobre a família no Museu do Imigrante Italiano, em São Paulo. Itália, filha de Ettore, que já nasceu no Brasil, é mãe de meu avô. Do estado de São Paulo, houve parentes que vieram para Belmiro Braga, em Minas, terra de meu avô. Não temos tantos detalhes desse percurso de São Paulo para Minas Gerais, que se perdeu ao longo da história. Os imigrantes vieram para trabalhar no campo. No começo, a família parece que ficou no meio rural mesmo. Os filhos de Ettore tomaram vários rumos. Alguns continuaram em São Paulo. O meu ramo foi para Juiz de Fora — detalha.
A Manchester mineira já é um capítulo à parte na imigração:
— Juiz de Fora era basicamente uma porta de entrada dos imigrantes que desciam no porto do Rio de Janeiro. Vinham de navio até o Rio e depois eram deslocados para uma hospedaria em Juiz de Fora que, de 1888 até 1906, fazia o registro deles. A partir desse registro, tomavam seu rumo. A maioria ia para fora da cidade, mas aqui também ficou uma parcela significativa que foi trabalhar no meio urbano. Na virada do século XIX para o XX, Juiz de Fora estava em desenvolvimento, com indústria, comércio…
Não foi apenas na indústria pela qual a cidade mineira ficou conhecida.
— Eles não se destacaram só na indústria têxtil, mas também na construção civil. Boa parte dos prédios tombados como patrimônio da cidade é feita por projetistas e construtores italianos. A mão de obra tinha também pedreiros e serventes italianos.
Historiador, Rafael elaborou até tese de mestrado sobre a imigração na Universidade Federal de Juiz de Fora.
— Hoje, nós ainda topamos com italianos na cidade. E na minha pesquisa falei sobre uma Maçonaria italiana. Quando ela foi fundada, em 1902, e até 1925, ela era exclusivamente de italianos. Depois de 1925, a imigração diminuiu. Começaram a chegar menos italianos para a loja e a Maçonaria acabou se abrindo. Mas hoje há ainda algum italiano na loja. Há italianos com destaque na cidade. Juiz de Fora tem o que chamavam de Vice-Consulado, que é a Casa d’Italia. Lá tem aulas de italiano, dança italiana. Juiz de Fora está na área do Consulado de Belo Horizonte.
Um italiano em especial é lembrado por Rafael Bertante pelo trabalho desenvolvido em Juiz de Fora:
— A gente sempre fala no Pantaleone Arcuri. Ele foi um importante empresário da cidade. Tinha companhia de construção civil. Mas também vendia material de construção. Ele trouxe algumas inovações, como o ladrilho hidráulico, a telha de amianto. Foi o responsável por grandes construções que fazem parte do patrimônio da cidade, como a antiga prefeitura de Juiz de Fora, o Cine-Theatro Central, a própria Casa d’Italia. A construtora dele começou em 1895. Mas o auge foi na primeira metade do século XX.
Hoje, o nobre imigrante que foi condecorado pelo então Rei da Itália Vittorio Emanuele III e tornou-se cidadão honorário de Juiz de Fora, dá nome a logradouro na cidade: Rua Comendador Pantaleone Arcuri.