O Brasil ainda não tinha abolido a escravidão, o que só ocorreria dez anos mais tarde, mas já havia procura por trabalhadores estrangeiros do outro lado do Atlântico. O navio que havia zarpado do porto de Gênova atracava no dia 8 de março de 1878 em Vitória, trazendo o menino de quatro anos Valentino Alessandro Olinto Franceschetto, bisavô de Cilmar. Natural de Longare, na província de Vicenza, na Região do Vêneto, a família, antes de embarcar em Gênova, viajou de trem dentro da Itália. Valentino migrou em companhia dos pais Gaetano Bortolo Franceschetto e Rachele Gobbato, que desembarcou na capital capixaba ainda grávida de Giuseppe. Assim, começou a história da família no Brasil.
— De Vitória, os imigrantes viajaram de canoa até Alfredo Chaves pelo Rio Benevente. Eles foram assentados na Colônia Rio Novo, num loteamento de 3 mil alqueires em terras devolutas pelo governo, que não eram muito boas. Por volta de 1910, as famílias mudaram-se para a Fazenda do Centro, a 12 quilômetros de Castelo, minha cidade natal. Uma congregação de padres agostinianos da paróquia de Vila Benevente loteou as terras. Os antigos proprietários da fazenda não conseguiram mantê-la após o fim da escravidão. Os agostinianos adquiriram parte das terras e as distribuíram pelos colonos. Estes tinham cinco anos de carência para produzir e depois pagar por elas. Uma espécie de reforma agrária — conta Cilmar, lembrando que produtos cultivados pelos camponeses eram diferentes nos dois países e que a imigração deu novo impulso ao estado.
— Na Itália, os trabalhadores cultivavam em geral vinícolas. Aqui, havia a monocultura do café. O Espírito Santo, até meados do século XIX, ficou muito isolado. Por questão de segurança, os colonizadores portugueses isolaram as minas no ciclo do ouro, no século XVII. Portanto, nesse período, quase não se abriram estradas. Houve mais de cem anos sem investimentos para proteger o ouro. A taxa de ocupação populacional antes da imigração era baixa — explica.
Os imigrantes procuravam manter-se fiéis a seus costumes. Mas a campanha de nacionalização durante o Governo Vargas, no fim da década de 1930, para diminuir a influência das comunidades estrangeiras, mais tarde acentuada com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial contra as forças do Eixo, do qual a Itália fazia parte, provocaram mudanças:
— Os italianos eram muito apegados à sua religiosidade, à manutenção das tradições familiares. Falavam dialetos vicentino, veronese… Quando o Brasil entrou na guerra, houve até gente presa por falar línguas estrangeiras — recorda Cilmar.
Hoje, os descendentes de italianos e de outras nacionalidades fazem parte significativa da formação do povo capixaba. Embora não existam dados precisos, alguns estudos indicam que os oriundos do Espírito Santo estejam mais presentes proporcionalmente do que em outros estados brasileiros mais populosos, como explica o diretor-técnico do Arquivo Público:
—Acredita-se que talvez até três quartos, ou seja, 75% dos capixabas, sejam descendentes de italianos. Em torno de dois milhões, embora também tenham ascendência de outras nacionalidades. São menos em números de pessoas do que em outros estados, como São Paulo e Rio de Janeiro, mas são maiores em proporção.
Desde 1995 no Arquivo Público, Cilmar Franceschetto aprendeu o italiano, cultiva suas raízes e procura orientar outros oriundos:
— O trabalho na documentação da imigração aqui no Espírito Santo foi o mais criterioso de todo o Brasil. A partir de fotos e documentos, ajudamos muitas famílias a obter a cidadania italiana, com um escritório móvel que coletou dados em todo o estado — afirma, satisfeito.
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