Depois de lutar na Segunda Guerra, Mario Bolla deixou a Itália rumo ao Brasil. Em São Paulo, ele e sua família se estabeleceram, até que o filho Giancarlo começou a trabalhar em restaurantes. Os anos se passaram e ele se tornou um dos mais respeitáveis chefs de cozinha do país. Giancarlo Bolla em depoimento à repórter Janaina Pereira.
Meu pai Mario Bolla lutou na Segunda Guerra Mundial e ficou desolado, pois toda a sua família foi morta no conflito. Ele saiu de Sanremo e veio para o Brasil em 1950. Naquela época, os italianos iam muito para Buenos Aires e São Paulo de navio e eu tinha um tio que trabalhava como chef de cozinha em uma dessas embarcações, fazendo a rota entre Itália e América do Sul.
Alguns anos depois, quando meu pai se estabilizou na capital paulista, chamou a minha mãe Nuccia e eu para virmos ao Brasil. A princípio, não queríamos ficar, pois era tudo muito diferente. Na Itália, eu ajudava minha mãe em tudo o que era preciso. Tive uma infância difícil em colégio de freiras dos dois aos cinco anos e fiquei adulto muito cedo. Aos nove, já sabia fazer massa fresca e rechear raviólis. Aos 12, tive o meu primeiro emprego, na época das férias escolares, em um bar que só abria para o verão, algo muito comum em cidades do litoral italiano.
No Brasil, meu pai comprou um sítio em Itapevi, onde criava coelhos, plantava e fornecia produtos para os italianos daquela região, até hoje com muitos ítalo- brasileiros. Acho que o clima favorece o vinho e é mais parecido com as temperaturas com que eles estão acostumados. Eu e minha mãe acabamos ficando em definitivo por aqui, e, com 16 anos, arrumei um emprego como organizador de discos. Eu não falava o idioma e precisava trabalhar, mas com a organização dos discos eu só tinha que saber os números.
Quando me senti mais seguro com o idioma, bati à porta de um restaurante do centro de São Paulo, chamado Le Arcate, e pedi emprego. Eu tinha uma certa experiência e estava cansado de comer mal; então pensei que, trabalhando em um restaurante italiano, seria melhor para mim. O estabelecimento vivia cheio. Trabalhei como garçom. Anos depois, consegui emprego no Rubaiyat como maître-gerente. Aos 26 anos, eu era o mais jovem maître d’hotel, o que naquela época significava muito, porque você deveria executar várias tarefas com maestria para exercer aquela função.
Em 1970, abri o La Tambouille, meu primeiro restaurante, hoje prestes a completar 44 anos e com uma filial em Brasília. Participei de outros empreendimentos do ramo, na sociedade formada pelo grupo Gallery, o Mezzaluna e Manhattan, e até um restaurante nos Estados Unidos, o Boccacio, em Washington DC. Isso tudo exigia muito do meu tempo. Por isso, em 1989, saí da sociedade para me dedicar mais ao La Tambouille.
No início dos anos 1990, fui convidado para fazer parte de um projeto chamado Leopolldo, na Avenida Brigadeiro Faria Lima. Era belíssimo, decorado por Jorge Elias, meu sócio, juntamente com Francisco Lima e Fernando Dhelomme. Depois, mudamos para o Morumbi, abrimos mais duas casas homônimas, mas agora com vocação para eventos, pois São Paulo mudou muito. Hoje, temos ainda o Bar des Arts, que se localiza em um espaçoso terreno no qual também é possível fazer pequenos eventos.
Atualmente, minha mulher e eu vamos à Itália a passeio e esporadicamente para visitar alguns fornecedores. O país parece geograficamente pequeno, mas é enorme em cidades e culturas, com muito para se descobrir. Fizemos recentemente uma viagem a Verona para conhecer outra parte da família Bolla, pois a família do meu pai era da Lombardia e do Vêneto, e minha mãe da Ligúria, perto da fronteira com a França. Foi extremamente divertido: fomos até a região das vinícolas e conhecemos a vinícola Bolla. Pode ser que desse encontro nasçam bons frutos. Também tenho primos na Ligúria. Minha memória afetiva com a região é tão grande que, para mim, é muito difícil ir até a Itália e não passar por lá.
Giancarlo Bolla
São Paulo – SP
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