A Itália já estava vivendo os tempos do milagre econômico, após os difíceis anos do imediato pós-guerra, quando Gerardo Paglia deixou a cidadezinha de Livello, na província de Potenza, na região da Basilicata, para tentar a sorte na América do Sul. Em 1957, Gerardo, então com 37 anos, rumou para São Paulo, onde nasceu o filho Ernesto Paglia, um dos mais conhecidos jornalistas da televisão brasileira. Em conversa com o repórter Maurício Cannone, Ernesto revelou a história de sua família.
O jornalismo está no sangue da família Paglia. Antes de emigrar para o Brasil, Gerardo já havia trabalhado na área quando morava na Itália, embora tenha também experimentado outras atividades:
— Ele veio de um paesino, mas depois andou por Roma, por Turim, e trabalhou no jornal La Stampa. Veio para o Brasil em busca de oportunidades. As coisas não iam tão bem na Itália para ele, caso contrário não teria saído de lá. Meu tio Mauro já estava no Brasil quando meu pai emigrou para trabalhar com ele. Engenheiro, meu tio tinha uma construtora — revela Ernesto Paglia.
Em 1957, aos 37 anos, Gerardo chegou à capital paulista, onde Ernesto nasceu em 1959. Ainda bebê mudou-se para o país de Haida, sua mãe, argentina de origem espanhola:
— Eu tinha 11 meses de idade quando fomos para Resistencia, na Argentina. Meu pai havia conhecido minha mãe num American Bar que ele tinha na Rua Augusta, em São Paulo. Ela era frequentadora do local, onde havia café expresso, música no jukebox, tabacaria. Na Argentina, meu pai fazia um jornal distribuído gratuitamente, que saía aos domingos.
Depois de alguns anos, a família decidiu voltar para terras paulistas:
— Eu já tinha quase cinco anos quando voltamos para São Paulo. Meu pai foi trabalhar num jornal dos Diários Associados. Depois, a convite de um político do antigo PSD, fomos para Ribeirão Preto. Eram tempos de jornalismo romântico, com remunerações também românticas. Ele fazia um encarte escrito em italiano aos domingos no diário local. Também levava grupos de italianos que vinham ao Brasil nos anos 60, na onda do pós-guerra. Tinha um programa de música italiana numa rádio de Ribeirão, na qual se tocavam canções de Bobby Solo, Sergio Endrigo, Gigliola Cinquetti, Peppino di Capri, Domenico Modugno… Isso além de lecionar latim — revela o jornalista, filho de pais de nacionalidades diferentes, mas que não falava nem italiano nem espanhol em família: somente o português.
A língua paterna foi aprendida fora de casa: Ernesto frequentou a società Dante Alighieri, em Ribeirão Preto, lia em italiano e estudava a sonoridade da língua.
Formado em Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), começou a carreira na Rádio Jovem Pan, da qual foi demitido em 1979 após participar de uma greve de jornalistas:
— Nós nos inspiramos nos senhores barbudos metalúrgicos do ABC paulista. Acabei perdendo o emprego na rádio e logo depois fui bater na porta da Rede Globo — conta ele.
Tornou-se um dos principais repórteres televisivos. Rodou o Brasil e o mundo, inclusive a Itália. É casado com a também jornalista Sandra Annenberg, apresentadora do telejornal Hoje, com quem tem uma filha, Elisa, de 12 anos, além dos filhos Bernardo, de 31, e Frederico, de 28, do casamento anterior. Participou de grandes coberturas e utilizou em seu trabalho a língua paterna:
— Não entendo de futebol, mas cobri a Itália em diversos momentos durante oito Copas do Mundo. Foi o que mais me ligou ao futebol. De 1982 a 2014, só não fui à Copa da França, em 1998.
Em 1982, o repórter oriundo até brigou com jornalistas do Belpaese. Foram vários problemas. Um deles foi criado por um repórter do diário Il Giorno, que fez uma brincadeira com o atacante Paolo Rossi e o lateral Cabrini, a qual foi interpretada como se o jornalista tivesse escrito que os dois teriam um caso. Mas essa não foi a única fonte de atrito da squadra azzurra com os enviados especiais à Espanha:
— Os colegas italianos eram muito criativos. Tinham escrito que os jogadores pulavam o muro da concentração para ir ao cassino. As mulheres deles certamente não gostaram. Eles pararam de falar com a imprensa italiana. Eu estava em La Coruña, na Galícia, e era o único da mídia estrangeira a acompanhar mais de perto a Itália. Comigo eles falavam. E eu até passava algumas informações aos colegas italianos. Após o final da Copa no Santiago Bernabeu, o técnico da Itália, Enzo Bearzot, deu entrevistas no campo a vários canais da Rai. E eu estava lá esperando minha vez de fazer também uma exclusiva. Os repórteres da Rai queriam me expulsar, mas o Bearzot não deixou. Falou comigo e me deu um beijo, atitude tipicamente italiana, e disse: “È un bravo ragazzo”.