Corria o ano de 1895. Francesco e Emma, recém-casados, deixavam Cavarzere, hoje pertencente à Cidade Metropolitana de Veneza, na Região do Vêneto, para cruzar o Atlântico. A chegada foi no Porto de Santos. Tempos difíceis para a família, que rodou pelo interior paulista antes de estabelecer-se na capital:
— Meus avós eram extremamente pobres. Não é verdade que tenham vindo ao Brasil para trabalhar na lavoura. Inicialmente deveriam trabalhar na indústria de um senhor em Valinhos, mas acabaram indo para Tietê. Minha avó estava grávida de Helena, irmã mais velha do meu pai. Depois foram para Valinhos, Jundiaí e Santo André — revela.
Dos seis irmãos, o segundo filho não sobreviveu. O caçula Joanin, como João era carinhosamente chamado em família teve melhor sorte. Ele não gostava de estudar e abandonou cedo os estudos, mas também porque precisava trabalhar para ajudar a família. Exerceu vários ofícios, entre os quais o de entregador de marmita e vendedor. O pai não queria que ele se tornasse artista:
— Ele preferia que o filho trabalhasse no comércio — lembra Maria Helena.
Em casa, os pais falavam um italiano macarrônico. Aliás, a comida italiana também era típica na casa dos Rubinato. O rapaz tentou a sorte em programas de calouros, no começo dos anos 1930, em São Paulo. No início, foi gongado. Mas a persistência o fez entrar para o mundo do rádio. E virou trampolim para o seu sucesso como ator e compositor.
— A voz não era o forte dele. Fez mais sucesso como ator cômico, além de compositor. Na Rádio Record, que tinha importância em São Paulo e era comparada à Rádio Nacional no Rio, o auditório ficava cheio. Havia gente que fazia fila na Record para acompanhar o programa História das Malocas, que tinha texto de Osvaldo Moles. Meu pai achava que João Rubinato não era um nome artístico. Então, escolheu Adoniran Barbosa, acho que inspirado em algum amigo dele, um tal de Luiz Barbosa. Saudosa Maloca foi uma música de muito sucesso. Com o dinheiro que ganhou com ela, comprou o terreno da primeira casa.
A fama do artista, porém, não se limitou ao Brasil:
— Trem das Onze ganhou uma versão na Itália chamada Figlio Unico. Pode ser encontrada no Youtube. Há versão também em inglês e do Japão. Alguém lhe deu até uma gravação feita na antiga Tcheco-Eslováquia. Mas ele a acabou deixando em um táxi quando voltava da rádio. Também compôs Piove, chamada de Samba Italiano. Em um kibutz de Israel, existe até um museu chamado Casa do Adoniran.
O museu israelense em homenagem ao músico brasileiro fica no kibutz Bror Chail, onde há um vagão do tempo do Império Otomano na Palestina de 1910, doado pela Companhia Geral de Trens de Israel.
Adoniran também fez cinema e trabalhou em novelas da TV Tupi.
Maria Helena nasceu em 1937, em São Paulo, do casamento de Adoniran com Olga. Porém, os dois se separaram, e a menina, aos seis meses de idade, foi viver com a tia Ainez, uma das irmãs do pai, que a criou junto com o marido Eurico. Por isso, acabou radicada no Rio de Janeiro. Matilde foi a segunda mulher do artista, com quem não teve filhos.
— Tive mais contato com meu pai na infância e adolescência. Ele ia me ver no Rio, lugar mais longe ao qual viajou. Meu pai gostava muito de São Paulo. Era parado de dois em dois minutos quando andava pelas ruas de lá. Gostava de debochar; debochar, não, de brincar com os cariocas. Ele dizia que era fácil fazer samba em Copacabana e Ipanema. Mas ganhou o concurso de músicas de carnaval do quarto centenário do Rio, em 1965, com Trem das Onze.
O artista morreu em 1982.
— Era corintiano fanático. Quando faleceu, a torcida cantou Trem das Onze com os isqueiros acesos no estádio.
A filha única do gênio da música escreve semanalmente no Blog do Noblat, colunista de O Globo.
— O italiano está no meu DNA. Falo, escrevo. Sou tradutora de italiano, além de inglês, francês e espanhol. Também tenho um filho único, Alfredo, que é torcedor do Milan — conta Maria Helena.
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