Comunità Italiana

Joblessgrowth

Domenico De Masi,
um dos mais importantes sociólogos italianos, é conhecido pelo conceito de “ócio criativo”, título de um de seus livros mais vendidos no Brasil. É professor de Sociologia na Universidade La Sapienza de Roma, onde atua como diretor da faculdade de Ciências da Comunicação

 

 

 

Que ninguém se iluda: o desemprego, longe de ser exclusividade da crise brasileira, só poderá ser combatido com a redução da jornada de trabalho

Em dez anos, entre 2003 e 2013, o desemprego no Brasil caiu de 12,4% para 5,7%. No mesmo período, na Europa e nos Estados Unidos, aumentou de 5% para 10%. Em 2014, o Brasil era um dos dez países com a taxa de desemprego mais baixa do mundo, superior somente a Suíça, Índia, China e México. Agora, o desemprego é de 6,9%, enquanto na Europa chegou a 11,3% (na Itália está em 12,9%); em particular, a taxa entre os jovens é de 20,4% (na Itália está em 40,2%). A situação de pessimismo generalizado na qual caiu o Brasil, alimentado pela maioria dos meios de comunicação, atribui ao governo Dilma a culpa do crescente desemprego, esquecendo que este é o principal problema do século XXI em todos os países do planeta, visto que, graças às novas tecnologias, temos condições de produzir, cada vez mais, bens e serviços, com um uso menor de trabalho humano. Este é o fenômeno do joblessgrowth, ou seja, do desenvolvimento sem trabalho.
Por que, desde os anos 1990, o trabalho é considerado a questão econômica, política e moral mais assustadora do mundo? Antes de tudo, precisamos admitir que desse mato não sai mais coelho: nos escritórios, assim como nas oficinas, a maioria das vagas que foram perdidas nas últimas décadas nunca mais serão repostas, pois os serviços prestados pelos atuais desempregados são, a esta altura do campeonato, inúteis. De fato, alguns deles produziam coisas das quais precisamos cada vez menos (por exemplo, o aço); outros produziam coisas que, agora, são produzidas de forma impecável pelas máquinas (como a montagem ou a lanternagem de carros, o saque de dinheiro, os exames laboratoriais, a distribuição de passagens ferroviárias); outros ainda exerciam atividades que, agora, todo mundo faz por sua conta (fazer testes de gravidez ou encher o tanque do carro são exemplos).
Durante muitos anos, enquanto as máquinas eram mecânicas, a tecnologia, por um lado, subtraiu vagas de trabalho dos seres humanos, mas, por outro, conseguiu criar novas vagas, e em quantidade maior. Para projetar e fabricar os carros que substituíram os cavalos, não foram usados cavalos, e sim operários.
Além disso, a riqueza proporcionada pelas máquinas foi reinvestida em outras fábricas, ou foi gasta em consumo. Em ambos os casos, direta ou indiretamente, contribuiu para a criação de novos trabalhos.
Porém, desde o aparecimento da eletrônica e da informática, este equilíbrio se rompeu, e as vagas de trabalho absorvidas pelas máquinas eletrônicas não são mais compensadas por novos investimentos ou novas ocupações.
Diante desta desagradável situação que atinge milhões de cidadãos, os governos procuraram imediatamente um remédio para isso, lançando as campanhas de job creation: aguçar a criatividade para inventar novas vagas de trabalho foi a palavra de ordem de todos os ministros do trabalho em todos os países ricos. No papel, o esforço parece ter surtido efeito, com sucesso: primeiro os Estados Unidos, mas também o Japão e o Brasil, em 50 anos, tiveram a capacidade de abrir milhões de novas vagas de trabalho. Mas, se vermos o que realmente aconteceu, as conclusões são bem menos felizes: de fato, a maioria das novas vagas refere-se ao que os norte-americanos chamam, com sarcasmo, de hamburger-flippingjobs: trabalhos por meio período, de baixa qualidade e baixos salários, exercidos, em sua maioria, por imigrantes e trabalhadores de meio expediente.
A esta altura, acossados por uma tecnologia onívora, que engole com a mesma velocidade os cargos de operários, empregados e dirigentes, ao invés de reduzir drasticamente os horários e a carga de trabalho, os governos começaram a diminuir os impostos dos empregadores, a cortejar os investidores estrangeiros no próprio país, a desenterrar formas dissimuladas de protecionismo e a incentivar a flexibilidade contratual.
Somente há pouco tempo, mas de forma muito lenta, está se difundindo a exata percepção de que a sociedade pós-industrial, diferentemente daquela rural ou industrial que a precederam, é caracterizada por uma progressiva entrega do trabalho à informática, à robótica, às nanotecnologias, às biotecnologias, aos lasers e a uma relação cada vez mais desequilibrada entre tempo de trabalho humano, que diminui, e o tempo livre, que aumenta.
Portanto, que o Brasil não invente justificativas: seu desemprego não depende tanto da crise política quanto do progresso tecnológico. Na medida em que as empresas brasileiras irão se modernizar, informatizando-se, o desemprego vai aumentar — a menos que não se reduza drasticamente o horário de trabalho.