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Memórias de uma infância e de um país

21 de janeiro de 2016 - Por Comunità Italiana
Memórias de uma infância e de um país

Memórias de uma infância e de um paísAutor, diretor e ator do monólogo que conta a história de seus avós italianos, Paulo Betti revela à Comunità detalhes de sua peculiar trajetória de vida, que ajudou a despertar muito cedo sua consciência política

O objetivo era contar a sua origem peculiar e sua intensa infância passada no interior paulista. Mas, ao viajar pelo país com a peça Autobiografia autorizada, o ator e produtor Paulo Betti, neto de imigrantes lombardos e vênetos, percebeu que estava contando a história da imigração italiana no Brasil.
— Eu só fui me dar conta disso quando a Fernanda Montenegro veio assistir à peça e, então, quando acabou, ela comentou da plateia que “é sobre nossos pais e sobre nossos ancestrais que vieram da Itália, você contou a nossa história, dos imigrantes italianos”. Aí eu me toquei — revelou o ator à Comunità, enquanto se preparava para subir ao palco, no teatro Glauce Rocha, no centro do Rio.
A obra, escrita por Paulo e dirigida por ele junto a Rafael Ponzi, se concentra nas figuras do avô João Fontanelli e da avó Celeste Maffei, que chegaram juntos de Bergamo, em 1889. Ambos marcaram fortemente a infância do ator.
— Meu avô morreu quando eu tinha 10 anos e minha avó, quando eu já tinha uns 30 anos. Eles desembarcaram no porto de Santos e foram para Rafard (SP), onde minha avó teve uma filha, minha mãe — contou o artista, que, durante o espetáculo, mostra o passaporte de seu outro avô, o paterno, Paulo Bet, que nasceu em Treviso, através do qual obteve sua cidadania italiana.
O público se emociona com o monólogo, no qual o ator revive os dramas e as alegrias dos personagens da família de parcos recursos, como o avô Fontanelli, que era lavrador.
— Lembro que ele era muito quieto e me levou para conhecer a igreja do Bom Jesus do Bonfim de Água Vermelha, que era a igreja de um Preto Velho. Eu lembro que ele era trabalhador da roça, tinha uma coisa que eu achava bonita, ele tinha um jardinzinho na frente da choupana, tinha uma pequena cabana na roça onde fazia a siesta, na frente tinha um jardim. Eu achava isso tão bonito… — recordou.
A família se mudou para Sorocaba quando Paulo, o 15º filho, temporão, do casal Ernesto e Adelaide, tinha três anos de idade. Sete anos depois, o avô morria, mas as lembranças do italiano trabalhando na roça nunca saíram de sua mente.
— Meu avô era um imigrante italiano que trabalhava como meeiro para um fazendeiro negro. Então, eu ia à roça e via a casa grande do ponto de vista da senzala, onde estava meu avô. Pela história da minha família, a quantidade de filhos que minha mãe teve, sendo eu o 15º, eu pensei: acho que essa história merece ser contada, mas eu tinha uma coisa de pudor, uma egotrip. Mesmo assim, eu achei que era uma história diferente, pois fala não só da história corriqueira do meio rural para a cidade, mas também da imigração italiana no Brasil. Meu avô, ao contrário do (Francesco) Matarazzo, não enriqueceu. Ambos foram para a mesma região, Sorocaba, só que Matarazzo ficou rico, virou conde, ganhou condecoração, e meu avô não. Sua trajetória é de um homem analfabeto que trabalhava na roça — explicou o ator, que estudou italiano com um professor particular, já esteve na Itália diversas vezes e não vê a hora de viajar ao país novamente.

Fã de Fellini
O ator de 63 anos e pai de três filhos confessa sua admiração pelo cinema italiano, especialmente por Fellini.
— A história dos meus avós está praticamente contada no filme Árvore dos Tamancos, de Ermmano Olmi. O cineasta italiano por quem sou absolutamente fanático é Federico Fellini, e meu ator predileto em todos os tempos é Marcelo Mastroianni. Fellini para mim é muito especial. O lugar que mais me fascina na Itália fica em Roma, bem atrás daquele lugar onde Fellini filmou, perto da Fontana di Trevi, na Cinemateca de Roma — comentou o artista, cujo sobrenome verdadeiro é Beti.
— Mudei meu nome de Beti para Betti, com dois tês. Tem um autor italiano chamado Ugo Betti, e também uma atriz filha dele, que trabalhava nos filmes de Bertolucci, Laura Betti. Na hora de fazer o nome artístico, eu achei simpático — revelou o ator, que já viveu o papel de Lamarca e de Getúlio Vargas no cinema.
Além da narrativa de Betti, a peça inclui projeções de fotos antigas e documentos, e tem uma parte musical muito forte, com canções caipiras que fizeram sucesso no Brasil nos anos 1950 e 1960. Em alguns momentos, ele se veste como sua avó e sua mãe. Outro detalhe curioso revelado no monólogo é o forte lado místico da mãe de Paulo, que chegou a ser benzedeira. Dentre os momentos mais dramáticos, está a morte do pai, esquizofrênico. A mãe, para ter alguma renda, teve que alugar um cômodo da casa para outras famílias. Tudo isso o menino Paulo observava e, mais tarde, colocaria em anotações, que viraram a base da peça.
 — Essa história eu venho anotando a vida inteira. Desde menino, eu tinha um cadernão, diversos cadernos e blocos. Como meus pais eram mais velhos e analfabetos, meus irmãos, que tiveram pouquíssima escola formal, me contavam muitas histórias e eu fui muito protegido por eles, fui ganhando uma responsabilidade de ser o depositário de todas aquelas informações. Eu era o cara que tinha que contar essa história. Quando tive a ideia de montar essa peça, percebi que já estava escrito e já estava tudo guardado. Hoje, percebo que é muito importante quando você conta suas histórias pessoais; você desperta nas pessoas o desejo de contá-las e valorizá-las. No fundo isso é coisa muito valiosa — comentou o dramaturgo, que já apresentou Autobiografia autorizada em cidades como Brasília, Sorocaba, São Carlos, Uberlândia e Luanda, capital de Angola.
A peça tem um lado cômico, pois o público ri bastante em vários momentos.
— Tem 50% de comédia, 25% de drama e 25% de poesia — comentou Betti, que mora no Rio desde 1984.

Militância política desde cedo
A plateia se surpreende com detalhes da vida do ator, que já integrou o elenco de mais de 20 novelas e diversos filmes, representando personagens populares, como o Timóteo de Tieta e mais recentemente o blogueiro gay Téo Pereira, em Império. Durante a juventude, enquanto estudava na Escola de Artes Dramáticas da USP, ele trabalhou no escritório de uma fábrica mais de oito horas por dia para se manter na capital paulista. Vivências como essa explicam a sensibilidade e a militância política do artista, que produziu o histórico videoclipe do jingle Lula Lá (1989).
— Minha consciência política tem muito a ver com a condição da minha família, não necessariamente por serem italianos, mas por serem camponeses, lavradores, e meus irmãos serem operários. Vivi a transição da roça para a cidade. Todos os meus irmãos trabalhavam como operários. Então, não tinha jeito. Quando era menino escrevia poesias sobre o meu pai trabalhando como lavrador. Tudo isso me deu uma leitura, um comprometimento com a situação da minha família. Eu não podia ser um garoto problemático, um rebelde sem causa, e sim um menino consequente, que tinha que compreender as dificuldades que eles tinham. Eu vim dessa formação campesina e de operariado, apesar de que meus irmãos me protegeram e pegaram muito mais pesado do que eu — lembrou.
Militante do PT, ele opina sobre a atual crise política e econômica vivida no país após 13 anos com o partido no poder.
— O Brasil tem uma classe dominante, a casa-grande, muito cruel, em toda a sua história. Isso sempre foi uma coisa muito forte aqui, a injustiça, a questão social. O Brasil sempre foi um país muito injusto. Eu sempre achei que deveria me posicionar: então eu me alinhei sempre com o PT por isso. Agora, evidentemente que, com todos esses desmandos, há uma decepção. Apesar de o PT não ter conseguido manter sua diferenciação do ponto de vista da ética, da moral, ainda tenho uma visão conjuntural e mais global, de quem favorece mais os despossuídos. Apesar de todos os problemas, eu continuo me alinhando pela esquerda, e pela esquerda do PT. E muita coisa boa foi feita — afirmou.
Sobre um eventual impeachment da presidente Dilma, ele não tem dúvidas em classificar a tentativa como um golpe.
— Não houve aceitação do resultado eleitoral da parte da direita. Cavaram um buraco profundo de crise institucional e política, que levou a uma crise econômica muito forte. Nunca houve folga para o PT, que sempre foi absolutamente atacado pela imprensa dominante. Por isso, eu continuo apoiando essa ideia, apesar de achar que tem que melhorar muita coisa — concluiu o ator, que classifica o atual momento nacional como “purgativo”.
— Essa purgação é positiva, acho que precisamos de lideranças políticas. A classe dominante está sendo presa… Acho que é esse o processo. Quando você tem uma infecção, deve colocar para fora. Como um furúnculo que se espreme. Espero que seja um furúnculo enorme, e não um câncer generalizado — finalizou o artista.  

Comunità Italiana

A revista ComunitàItaliana é a mídia nascida em março de 1994 como ligação entre Itália e Brasil.