Comunità Italiana

Mia madre

Novo filme de Nanni Moretti marca volta do cineasta italiano a temas ligados a laços e culpas familiares

Na cidade de Roma, a cineasta Margherita se dedica às filmagens de seu novo longa-metragem, cujo protagonista é o charmoso ator americano Barry Hughins. Ao mesmo tempo, ela precisa lidar com vários problemas em sua vida pessoal, como o término de um relacionamento amoroso e a doença de sua mãe, que está internada em um hospital. No filme mais recente do cineasta italiano Nanni Moretti, Minha Mãe (Mia madre), são revisitados alguns temas caros ao diretor, como laços familiares, culpa e grandes questionamentos da vida.
Protagonizado por Margherita Buy, o longa foi considerado por críticos de cinema como o melhor do diretor desde O Quarto do Filho, pelo qual Moretti ganhou a Palma de Ouro no festival de Cannes, em 2001. O elenco traz ainda John Turturro como o astro internacional Barry Hughins, Giulia Lazzarini como Ada, mãe de Margherita, e o próprio Nanni Moretti, que interpreta Giovanni, o irmão da cineasta. Participar de seus filmes como ator já é uma tradição para Moretti, que atuou em 11 de suas 24 produções. Entre os papéis de maior destaque, estão o psicólogo incumbido de convencer o Papa a assumir seu posto como líder da Igreja Católica, em Habemus Papam (2011), e o psicanalista pai de família de O Quarto do Filho (2001).  
Depois de ter se afastado do universo familiar em seus últimos longas, o uso de referências pessoais, tão presentes em Caro Diário (1993) e Aprile (1998), seus filmes mais claramente autobiográficos, volta com força nesta última obra. No primeiro filme, Moretti interpreta a si mesmo em uma trama dividida em três partes que não conversam entre si. Na primeira, o diretor aparece percorrendo as ruas de Roma a bordo de sua Vespa; na segunda, participa de um cruzeiro com um amigo, em busca de paz e descanso. Por fim, usa uma consulta médica para lançar um olhar crítico e bem humorado às neuroses de seu cotidiano e de seus conhecidos. Já em Aprile o cineasta faz uma espécie de balanço de sua vida ao se tornar pai pela primeira vez. Com muito humor e autocrítica, Moretti luta contra as distrações do dia a dia enquanto tenta fazer um documentário sobre as eleições italianas.

Longa mais recente lembra universo retratado em O Quarto do Filho
Caro Diário e Aprile conquistaram boas críticas na Itália, mas foi com O Quarto do Filho que o diretor alcançou o sucesso internacional. O drama, que conta a história de um psicanalista cuja família entra em profunda crise após a morte do filho em um acidente de mergulho, conquistou diversos prêmios, incluindo a Palma de Ouro de Cannes e o Globo de Ouro italiano de melhor atriz estreante para a jovem Jasmine Trinca.
Cinco anos depois, Moretti lançaria uma crítica mordaz ao então primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, na forma do longa O Crocodilo (2006). O filme conta a história do produtor de cinema Bruno Bonomo, que, ao ver o diretor de sua produção se demitir, é forçado a oferecer à RAI, rede de televisão estatal italiana, o roteiro de O Crocodilo, escrito por uma jovem diretora e centrado na figura de Berlusconi. Enquanto passa por inúmeras dificuldades em sua vida pessoal, Bonomo percebe que produzir esse filme é a única coisa que o mantém vivo.
Depois da política, foi a vez de o inquieto cineasta direcionar seu foco para a Igreja Católica, com a inusitada trama de Habemus Papam. Lançado em 2011, o filme, que conta a história de um Papa que renuncia ao cargo de líder máximo da igreja, revelou-se assustadoramente premonitório, já que, dois anos depois, Bento XVI surpreenderia católicos e não católicos de todo o mundo ao abrir mão de sua posição como Sumo Pontífice.
O drama vivido pelo papa, interpretado com delicadeza por Michel Piccoli, é contrabalançado pelos momentos de humor protagonizados pelo personagem de Moretti, um psicanalista que deve convencer o religioso a aceitar o cargo para o qual foi escolhido — sob ameaça de ser mantido trancado no Vaticano até que faça o papa mudar de ideia.  
Em seu filme mais recente, Moretti deixa um pouco de lado as questões políticas e as críticas a instituições para traçar um retrato mais íntimo do cotidiano de pessoas comuns, com suas alegrias e dores. Os temas tratados em Minha Mãe são muito próximos de O Quarto do Filho, mas aqui são tratados de forma mais sutil, como se a maturidade houvesse trazido ao cineasta a certeza de que as emoções devem ser vividas com discrição.