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Multiculturalismo versus culturalismo

24 de outubro de 2011 - Por Comunità Italiana

{mosimage}Autor de livro sobre as relações entre Brasil e Itália explica a importância da participação italiana no desenvolvimento brasileiro e as razões que levaram o país à crise por conta da ausência de lideranças

A Itália dilui-se no tecido social brasileiro: humano, cultural, artístico, econômico, empresarial. Mas “a italianidade brasileira descola-se da matriz para integrar outra identidade nacional. A derivação é distinta da origem”, destaca o historiador Amado Luiz Cervo, professor da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto Rio Branco, com mestrado e doutorado pela Universidade de Estrasburgo.

A questão da identidade nacional italiana e a formação da identidade nacional brasileira é o tema principal do seu livro Relações entre o Brasil e Itália – Formação da italianidade brasileira, que será apresentado este mês, em Brasília, durante o MIB (Momento Itália-Brasil). A publicação é o resultado de um longo período de estudos e análise na Itália e no Brasil que levou o professor Cervo, especializado em História Moderna e Contemporânea, a investigar sobre as diferenças entre as duas identidades.

O docente gaúcho de origens italianas (pai de Verona e mãe de Treviso) explicou à Comunità que a “identidade brasileira é multiétnica e pluricultural, ao contrário daquela italiana”.

Comunità Italiana – A identidade brasileira é uma fusão de etnias originais que demonstra homogeneidade e heterogeneidade. No caso da Europa, pode denominar-se multicultural?

Amado Cervo – A experiência do multiculturalismo na Europa falhou, então agora surgiu o culturalismo de prevalência social da etnia própria da nação. É uma experiência muito diferente da brasileira porque aqui, da convivência de diferenças culturas, resultou uma nova identidade e disso nasceu uma nova sociedade multicultural. Ao contrário, a Itália não é um pais multiétnico, muito menos multicultural. Tem uma visão muito mais radical do que os outros países: a Alemanha não quer apagar outras presenças, como a turca, da mesma forma, a França, com a presença árabe e muçulmana, a Inglaterra, com as presenças indiana e africana. Eles não querem esmagar isso, mas não sabem como resolver esse problema, onde vão chegar. E aqui se sabe, se soube sempre: é como temperar uma comida, põe tudo que fica bom! Isso é um problema sério, é um aspecto que interessa muito à Europa e que aqui tem uma experiência única no mundo, em termos de grande dimensão social, porque o Brasil é um país que chega perto de 200 milhões de habitantes.

CI – A identidade italiana tem um peso muito grande na identidade brasileira. Mais do que Portugal?

AC – As nossas raízes são lusas, então a influência de Portugal de um ponto de vista étnico, cultural, político é mais relevante do que outras influências quaisquer. Mesmo do que a influência africana, ou italiana, ou espanhola, ou alemã, ou japonesa, ou chinesa, que influenciaram na formação da identidade brasileira. Mas o Brasil se distanciou muito das suas raízes lusas sob todos os aspectos. Portugal não teve presença econômica no Brasil, mas tem um legado histórico muito mais longo. Isso é o que não falta na parceria entre Itália e Brasil: as empresas italianas foram muito importantes  para a formação econômica brasileira, sobretudo a partir dos anos 70. O Brasil foi um destino privilegiado dos investimentos italianos e esse componente é muito importante na penetração italiana no Brasil.

CI – Como a Itália contribuiu na formação sócio-econômica brasileira?

AC – Como a influência étnica e cultural italiana se dilui na sociedade brasileira, a presença econômica também. As relações econômicas entre os dois países, além de investimentos e comércio, são marcadas por alguns ícones ilustrativos, entre os quais se destaca, em primeiro lugar, a presença da Fiat no Brasil, que chegou décadas depois da Pirelli. O Grupo Fiat tem faturamento aqui superior do que na Itália, e isso representa a importância que tem o Brasil para as empresas italianas. Além dos grandes grupos, está crescendo também o movimento das pequenas e médias empresas italianas em direção ao Brasil. Isso responde à capacidade de atração tradicional desse país, aumentada pela estabilidade econômica e política, pela afinidade cultural e por laços de parentesco que cerca de trinta milhões de oriundi preservam com famílias italianas.

CI – E na formação cultural brasileira? O que Itália aportou?

AC – A presença cultural e artística italiana no Brasil é enorme. Vem de longe, desde o Américo Vespúcio. Dante, Petrarca, Macchiavelli, Da Vinci e Michelangelo são só alguns exemplos da influência indireta diluída em ensino e na formação artística. Os grandes ícones culturais com uma influência direta foram Luigi Vincenzo De Simoni, Giuseppe Ungaretti, Alfredo Volpi, Candido Portinari, Pietro Maria Bardi e Francisco Matarazzo. Eles deixaram uma marca tão profunda na arte brasileira que moldou um pouco a formação artística nacional do ponto de vista do estilo, da produção artística e do ensino.

CI – No seu livro, o senhor analisa o conceito de formação da italianidade brasileira e identifica os fatores que agiram na transformação da italianidade de origem em brasileira. Poderia explicar esse tema?

AC – Houve três fases nessa chegada dos italianos ao Brasil: pertencimento, adaptação e agregação. A imigração de massa foi por volta de 1880-1900. O primeiro censo foi feito no Brasil em 1872 e havia só 6.000 italianos residentes. Em 1900, já eram quase 1 milhão e meio. Os italianos se esparramaram bastante. Uma grande parte trabalhou nas empresas de café, em São Paulo, outra grande parte no Rio Grande do Sul e em Santa Cataria, e uma parte menor no Espírito Santo e em Minas Gerais. Os dois focos principais foram São Paulo e Rio Grande do Sul. Por um tempo, eles se consideravam italianos: eu chamo isso a fase de pertencimento que vai até a Segunda Guerra. A segunda fase é a adaptação, embora não exista uma data firme que mostra a passagem de uma fase para a outra. A primeira poderia resumir-se na frase Eu sou italiano, eu pertenço à Itália, a outra fase, Eu estou num outro país, eu tenho que me articular aqui. A terceira fase é a contribuição. Os fluxos de italianos aumentaram: em 1979 se registraram 2 milhões de italianos que vieram ao Brasil. A Itália contribuiu muito na formação cultural brasileira, difundiu o culto do trabalho e do empreendedorismo, ao lado do culto da família, da religiosidade, da sociabilidade e da festa. É fundamental observar como a imigração italiana para o Brasil vai se diluindo no tecido social e na vida da nação, imprimindo-lhes seus componentes étnico e cultural, de modo espontâneo e natural, como variáveis integrantes do todo.

CI – Os italianos que moram na Itália percebem essa influência, esse legado tão forte no Brasil?

AC – Não muito. Porém, existe hoje uma cooperação descentralizada que articula regiões na Itália e no Brasil, mas se faz um pouco à margem, é um movimento mais da sociedade. Os contatos se estabelecem sobre tudo nas municipalidades ou nas regiões. Essa cooperação descentralizada é muito grande e equilibra um pouco os problemas que os dois governos têm de relações bilaterais desde os anos 1990.

CI – Como foram as relações entre os dois países na era Berlusconi e Lula?

AC – Nessa época as relações bilaterais foram confrontacionistas: nós temos um regime político de esquerda e lá tem um regime político conservador, de direita. Lula e Berlusconi não se apreciam. O governo Berlusconi obstruiu os interesses brasileiros em todos os planos e níveis, por exemplo, na questão do Conselho de Segurança da ONU, na OMS, nas relações e negociações entre Europa e o Mercosul. A diplomacia brasileira tem a percepção de que a Itália de Berlusconi obstrui os interesses brasileiros, não coopera, não colabora em todos os aspetos, inclusive os econômicos. Por exemplo, Lula foi várias vezes à Itália, enquanto Berlusconi não fez nenhuma visita oficial ao Brasil. Foi só uma vez a São Paulo a um encontro com os empresários, com a Fiesp, a Confindustria e a CNI. As visitas do Lula nunca foram retribuídas. Berlusconi só gosta de sentar-se na mesa dos ricos, não dos países emergentes ou subdesenvolvidos. O ambiente das relações bilaterais deteriorou-se nos anos 90 e, no século XXI, a Itália entra realmente em uma crise econômica e social e também de identidade.

CI – Crise de identidade?

AC – Sim, claro, porque Berlusconi fez emergir uma Itália que estava dormindo. É uma Itália de direita e ultradireita que tem as suas raízes no fascismo que nunca se apagou definitivamente. O regime Berlusconi fez ressurgir uma pequena Itália que se opõe àquela grande tradição democrática dos grandes intelectuais admiráveis. Essa pequena Itália que triunfa, que tem base na opinião pública. Em razão de todos esses fatores, surgiu um conflito muito grande entre Brasil e Itália. É nesse sentido que deve se entender o caso Battisti. Tem muito de psicologia por trás disso, acima do direito, das regras. A opinião pública, jurídica e técnica era favorável à extradição, mas a questão foi pessoal entre o Lula e Berlusconi.

CI – Lula e Berlusconi são duas pessoas muitos diferentes, uma de direita e outra de esquerda. Mas têm algo em comum?

AC – Os dois querem dar show, cada um do seu jeito. E o Battisti foi um instrumento, ele foi usado.

CI – E agora com Dilma?

AC – Ela é mais racional, é menos show woman. Há uma diferença de estilo entre Lula e  Dilma: ela é mais racional e técnica,  Lula era mais político e mais exibido. Mas não há uma diferença de conteúdo, de substância, tanto na política interna quanto na política exterior. Por exemplo, a questão dos direitos humanos: Dilma não mudou nada, só não a utiliza para dar show como Lula fazia. Porém, ela tem as mesmas posições, até mais firmes: não aprova a intervenção da Otan na Líbia, opõe- se junto com os países do Bric a uma eventual intervenção da mesma natureza na Síria. É uma visão mais racional dos direitos humanos, que devem ser respeitados por todos. A presença americana e da Otan no Iraque e no Afeganistão desrespeitam os direitos humanos.

CI – Qual será o futuro da Itália?

AC – Historiador só é profeta do passado, ele diz como aconteceu, como tinha que acontecer. O futuro, as perspectivas nós fazemos, mas só no exercício das perspectivas. O futuro da Itália é muito vinculado ao da União Europeia e também muito dependente de si. Acho que a Itália tem problemas gravíssimos a enfrentar. Primeiro, o problema econômico: há 20 anos, não há crescimento econômico, e isso significa já uma grande crise social e o descontentamento é o primeiro efeito disso. As eleições e a democracia mantiveram um regime que não trouxe resultados positivos sobre os aspectos econômico, social e político. Acho que a Itália vai ter que recuperar a sua tradição de país democrático, liberal, a base dos grandes pensadores italianos e não de um empresário que emergiu de um momento para outro, que soube manipular a opinião pública e manter-se no poder sem preocupar-se com a Itália. Ele administra aquilo como se fosse um departamento dos seus empreendimentos. A figura dele seduz a opinião pública porque ele é um homem bem sucedido, vive bem: é o ideal que todos os italianos buscam realizar individualmente e pessoalmente. Os italianos têm medo de mudar, mas eles terão que mudar. É preciso fazer emergir novas lideranças que tirem a Itália dessa crise.

CI – A manovra financiaria (pacote de medidas econômicas contra a crise) recém aprovada mudará o rumo da economia italiana?

AC – Esse pacote foi terrível, não tem muitas coisas substantivas. Não há medidas de crescimento econômico que os italianos exigem e necessitam. É um pacote que conserta erros do passado, mas não avança.

CI – E os italianos? Como enfrentam isso?

AC – Quando cai a esperança, a confiança no futuro, na nação, nos dirigentes, é o pior ponto de chegada. Acho que a Itália é muito pessimista. E é uma pena, porque tem substância, tem fatores, tem bases para não ter chegado ao que chegou e, para sair disso, não basta o Estado: também a sociedade é importantíssima.   

Comunità Italiana

A revista ComunitàItaliana é a mídia nascida em março de 1994 como ligação entre Itália e Brasil.