Nascido em Ístria, o boxista que hoje é comentarista da TV italiana deu diversas glórias ao esporte italiano e é considerado um dos maiores pugilistas de todos os tempos
Giovanni Benvenuti, ou simplesmente Nino. Ele nasceu na Isola d’Istria, no dia 26 de abril de 1938, na época, território da Itália, hoje Eslovênia, um dos países resultantes do fracionamento da antiga Iugoslávia. Conquistou o ouro dos pesos meio-médios em 1960 na Olimpíada disputada em Roma, ajudando a Itália a ficar em terceiro lugar no quadro geral de medalhas e em primeiro entre todos os países no boxe, e entrou para o Hall da Fama do Boxe como um dos maiores pugilistas de todos os tempos. A aptidão para o boxe foi herdada de seu pai, Fernando. Desde os 13 anos, já improvisava uma pequena academia na adega de casa. Em vez de retangular, o ringue era triangular: uma corda passava por três colunas. As luvas eram improvisadas com velhas meias esfarrapadas, socando um saco cheio de milho. Durante o período de amador, foram 120 vitórias e apenas uma derrota na Turquia.
Em 1956, vieram as grandes decepções. No mesmo ano em que a mãe Dora morreu com apenas 46 anos, foi excluído da Olimpíada de 1956, em Melbourne. O momento de glória chegaria quatro anos depois na Cidade Eterna. Na Olimpíada de 1960, ganhou o ouro ao vencer o soviético Yuri Radonyak, com a aliança de sua mãe amarrada no sapato da perna esquerda. Além de subir no degrau mais alto do pódio, levou a Copa Val Barker, concedida ao melhor pugilista da competição em todas as categorias.
Nos Jogos de Roma, Nino superou até mesmo o legendário Cassius Clay. Passou por duros treinos, alimentação controlada e muito sofrimento para manter-se em forma. “Ni-no, Ni-no”, gritavam os torcedores italianos no PalaEur de Roma, palco de sua conquista olímpica — para ele, a mais importante de sua carreira. Medalha de ouro no pescoço, arquivou seus tempos de amador. Em 1961, já era pugilista profissional. Entre 1965 e 1966, ganhou títulos mundiais na categoria médio-ligeiros. Atingiu o auge entre 1967 e 1970 ao defender a primazia de melhor do mundo entre os pesos médios. Em 1971, depois de duas derrotas para o argentino Carlos Monzón, uma das lendas do boxe, decidiu que era hora de parar de lutar, aos 33 anos.
Como profissional, disputou 90 lutas: 82 vitórias (35 por nocaute), um empate e sete derrotas. Teve experiência como ator de filmes no cinema e na televisão. Fez prova para ingressar na carreira jornalística e foi trabalhar na redação esportiva da Rádio Rai, mas preferiu depois não exercê-la em tempo integral. Hoje, é comentarista de boxe na televisão. Casado duas vezes e pai de seis filhos, vive em Roma. Em 2006, foi porta-bandeira da Itália na cerimônia de encerramento da Olimpíada de Inverno em Turim. Fez amigos no boxe, mesmo entre seus adversários, entre os quais Emile Griffith, falecido em 2013. Derrotou duas vezes esse pugilista nascido nas Ilhas Virgens Americanas e perdeu um embate entre 1967 e 1968, em Nova York, pelo título mundial dos médios. Estima-se que 18 milhões de italianos fãs do boxe ficaram de madrugada com ouvidos ligados no rádio para acompanhar o ídolo.
Refúgio em Trieste após a expulsão de casa pela guarda de Tito
O atleta já se posicionou politicamente como de direita e inscreveu-se no Movimento Sociale Italiano-Destra Nazionale, em 1964, mas logo deixou a política. Recentemente considerou anacrônico definir-se de direita ou de esquerda. Em 1954, aos 16 anos, foi obrigado com a família a deixar sua casa em Istria. O Memorando de Londres, resolução assinada por Reino Unido, Estados Unidos, Itália e a antiga Iugoslávia, dividiu os territórios em litígio entre os dois últimos países em zona A e zona B. O lado A passou para a administração italiana e o B para a iugoslava, no qual se incluía Istria:
— Um comandante da OZNA, a guarda política de Tito, que governava a Iugoslávia, disse que queria a nossa casa para morar lá. Assim, no dia seguinte, tivemos de colocar tudo em um caminhão e fomos para Trieste — revelou Benvenuti, em algumas entrevistas.
Os iugoslavos e muitos italianos consideravam aqueles refugiados como fascistas. A esquerda estava contra eles. Por isso, Nino aproximou-se mais da direita. Mas ressalta que foi no esporte que ele conseguiu superar os traumas de refugiado.