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O bem da imperatriz desconhecida

20 de abril de 2012 - Por Comunità Italiana
{mosimage}A napolitana Teresa Cristina é pouco conhecida, no entanto, a esposa de D. Pedro II deixou grande contribuição ao país, sobretudo às artes e à arqueologia, e sua história tem permanecido oculta por preconceito e machismo, afirma historiador

Brasileiros ou italianos, poucos sabem que o maior país da América do Sul teve uma imperatriz napolitana. O professor de Literatura Brasileira e Língua Portuguesa da Universidade de Roma Tor Vergata, Aniello Angelo Avella, passou dez anos mergulhado em fontes até hoje pouco ou nada exploradas — como o seu diário e as cartas escritas e recebidas — entre os arquivos de Nápoles, Petrópolis e Rio para desconstruir o mito da imperatriz silenciosa. Ao preencher uma lacuna existente na historiografia de ambos os países, seu livro Una napoletana imperatrice ai tropici – Teresa Cristina di Bourbone sul trono del Brasile, que acaba de ser lançado na Itália pela Exòrma (www.exormaedizioni.com), traz um relato das atividades arqueológicas daquela que nasceu como princesa do Reino das Duas Sicílias, se casou com o brasileiro D. Pedro II por procuração em 30 maio de 1843, e foi a responsável por trazer ao Brasil centenas de relíquias diretamente das escavações de Pompeia e Herculano, além de achados etruscas da região de Veio, hoje no acervo do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, no Rio.
Para o professor Aniello, autor de Un fedele ritratto, peça que conta a trajetória da imperatriz apresentada com sucesso em Salerno e em Roma, e ainda inédita no Brasil, a figura de Teresa Cristina tem permanecido oculta nos livros de História por dois motivos: um certo machismo na historiografia, e o desprezo construído em torno da dinastia dos Bourbon, os grandes perdedores da Unificação italiana. “O resgate da história de Teresa Cristina é importante não somente para o Brasil, mas também para a Itália. Ao conhecer seus feitos no campo da arte e da arqueologia, os italianos podem se abrir mais ao contato com a riquíssima cultura brasileira, enquanto a historiografia brasileira pode derrubar falsos mitos, como o de que a influência italiana nas artes e na arquitetura da cidade do Rio de Janeiro foi escassa”, defende Aniello.

ComunitàItaliana – O senhor é o autor da primeira biografia da imperatriz napolitana Teresa Cristina. Sobre a vida do imperador D. Pedro II, pelo contrário, já se escreveram vários livros. Por que a figura da imperatriz é tão oculta, seja no Brasil, seja na Itália?
Aniello Angelo Avella – O panorama historiográfico sobre a imperatriz é de fato muito reduzido e muito escasso. Há pouquíssimos artigos sobre ela até hoje. Isso também é fruto de um certo machismo no modo de contar a História. Um artigo de Maria Eugênia Zerbini, de 2008, publicado na revista de História da Biblioteca Nacional, é um dos únicos a citar suas atividades arqueológicas… Concordo com a interpretação de que o machismo na historiografia a colocou na sombra, tirando-se luz da imperatriz para lançar holofotes sobre a figura do imperador filósofo e intelectual. Porém, além disso, há outra coisa que ressalto em meu livro: a historiografia brasileira, ainda hoje, assume uma postura semelhante àquela italiana de até poucos anos atrás. A Itália passou por um processo de Unificação concluído há 150 anos. A historiografia tradicionalmente premia os vencedores e pune os derrotados. Neste caso, o derrotado é o reino de onde vinha Teresa Cristina, irmã de Ferdinando II, rei das Duas Sicílias, derrotado nas guerras entre 1820 e 1861, antes da Unificação, através da ação do Reino de Savoia e também da ação de revolucionários como Garibaldi. O Reino das Duas Sicílias, ou a Dinastia dos Bourbon de Nápoles, saiu derrotada, e a historiografia italiana, até poucos anos atrás, sustentava que eram reacionários, que Nápoles era governada de maneira despótica, que era atrasada e por aí vai. Há uma parte de verdade e outra de mentiras. Em decorrência das celebrações da Unificação, se está refletindo muito sobre todos esses conceitos e o processo de construção da Itália. Os problemas atuais decorrem de distorções que aconteceram no processo de Unificação, cujas consequências pagamos até hoje. Muitos estudiosos reviram a tese de que Nápoles era uma capital atrasada. Em certos setores, era muito avançada: as primeiras ferrovias e locomotivas foram feitas na cidade, assim como nela foi construído o primeiro navio a vapor do Mediterrâneo. A cultura napolitana, no século XVIII, era riquíssima. Vários pensadores napolitanos iluministas da época influenciaram fortemente a Revolução Francesa, como o filósofo Filangieri, que muito falou de direitos humanos e condenou a escravidão.
No campo da arqueologia, as grandes escavações de Pompeia e Herculano foram feitas no final do século XVIII, sob os cuidados da dinastia dos Bourbon. Então, o julgamento da história brasileira sobre a imperatriz também deriva desse preconceito em relação aos Bourbon de Nápoles.
 
CI – Qual é a visão, na Itália, da imperatriz napolitana dos trópicos? Os italianos conhecem a sua história?
AAA – Absolutamente não, e este é o ponto. Escrevi esse livro porque a historiografia italiana desprezou até há pouco tempo tudo o que era bourbônico. Somente alguns arqueólogos na Itália a conhecem, devido à sua grande cultura arqueológica, contrariando algumas teses sobre sua suposta ignorância.

CI – Mas isso também não decorre do fato de a história do Brasil ser muito pouco conhecia no país?
AAA – Sim, é verdade. A cultura italiana é afetada por um certo provincianismo, provavelmente porque o país teve uma história na qual cada região era um Estado, com suas próprias línguas. De fato, a cultura italiana, quando se volta para o exterior, olha quase que exclusivamente para a França, a Inglaterra, a Alemanha, os Estados Unidos e a Espanha.

CI – Isso também não seria consequência de uma visão eurocêntrica?
AAA – Sim, mas a França, por exemplo, adota uma postura diferente e a historiografia francesa dá uma atenção maior ao Brasil. Nesse ponto, a Itália apresenta um comportamento contraditório, pois possui interesses enormes, econômicos, culturais e antropológicos, no país onde existe a maior colônia de oriundi do mundo, com mais de 30 milhões de descendentes. Grandes empresas italianas, como Fiat e Pirelli, estão aqui, além de uma enorme rede de pequenas e médias empresas, mas do ponto de vista histórico e cultural, na Itália, fala-se muito pouco do Brasil, embora, nos últimos anos, a situação tenha melhorado. Falava-se somente de futebol e carnaval. Hoje, existe um conhecimento mais amplo, graças à literatura, um veículo de conhecimento sobre o país muito mais avançado do que a historiografia. Além de Jorge Amado, se leem autores contemporâneos, como Rubem Fonseca.
 
CI – É verdade que quando a imperatriz desembarcou no Rio, em 1843, e D Pedro II a viu pela primeira vez, provou grande decepção por suas características físicas?
AAA – Quando começaram as negociações para o matrimônio, em 1841, não existia a fotografia. Dom Pedro quer saber quem é a pretendente e manda fazer um retrato em pintura.

CI – E também certamente ela devia querer saber como era o seu futuro marido…
AAA – Claro. De fato, citamos isso na peça (Un fedele ritratto). Chega até ela uma medalha com a imagem de Dom Pedro II. O retrato que chega até ele é a imagem de uma mulher ideal, tendo ao fundo o Vesúvio. Dizem que no primeiro encontro ele tenha se chocado e até chorado de decepção junto à sua ama de criação, a Condessa de Belmonte, que chamava de “dadama”, a qual teria aconselhado-o a casar-se, pois o matrimônio imperial não estava ligado ao coração, mas aos interesses de Estado. No entanto, me indago por quais motivos não existem documentos escritos sobre isso, mas somente vozes? Afinal, dezenas de pessoas assistiram ao primeiro encontro, entre militares e damas de companhia. É provável que a versão da decepção tenha sido difundida pelo embaixador da Áustria, pois os austríacos não estavam contentes com o casamento com uma princesa Bourbon. Encontrei dois testemunhos, entre os quais um oficial napolitano, o comandante da esquadra que estava presente no Rio, Eugênio Rodrigues, que escreveu um livro no qual relata a viagem de Nápoles ao Rio. Ele escreve que, ao contrário daquilo que se diz, o imperador já estava entusiasmado e via-se que estava apaixonado. Pode ser que tenha exagerado, mas é o único testemunho escrito oficialmente. Além disso, há a o testemunho da feminista e republicana Nísia Floresta, que não tinha nenhuma simpatia pelos Bourbon. Em um de seus livros, em que narra os três anos em que morou na Itália, descreve Nápoles como riquíssima e cheia de vida, e exalta o seu museu arqueológico da cidade. Nísia descreve as núpcias do casal, em que ela parecia bela e feliz. Aliás, a imperatriz se faz fotografar sem problemas quando surge a fotografia. Parecia que não era belíssima, mas também não era absolutamente esse monstrengo do qual falam. E, no final das contas, o fato que fosse feia ou bonita é totalmente secundário, visto o que representou historicamente.

CI – Qual foi a influência da imperatriz napolitana sobre as artes no Brasil?
AAA – Seu papel foi muito importante. Possuía uma grande cultura arqueológica. Quando veio ao Brasil, trouxe em seu dote uma rica coleção de arte antiga: as escavações de Pompeia foram realizadas pelos seus avós. Ela nasceu e cresceu nessa cultura. A exposição permanente no Museu da Quinta da Boa Vista, no Rio, conta com cerca de 900 objetos de arte pompeiana e de outros locais. Além do dote, ela recebeu uma herança na Itália, um terreno na região de Veio, ocupada pelos etruscos e posteriormente pelos romanos. Encarregou arqueólogos italianos de escavar no local, onde foram encontradas tumbas etruscas. Muitos daqueles achados foram enviados ao Rio. Trata-se de uma operação de alto valor artístico e simbólico. Em viagens à Europa e ao Egito com o marido, visitaram sítios arqueológicos. Quando o Reino de Nápoles chegou ao fim, em 1861, a atividade não foi interrompida. Estabelece-se, então, um intercâmbio entre a Itália unificada e o Brasil imperial: da Itália chegavam os objetos etruscos, pompeianos e romanos, e do Brasil embarcavam peças do artesanato indígena. Por isso, no Museu Pigorini, em Roma, e no Museu Cívico de Modena há riquíssimas coleções de arte indígena brasileira. Foi uma operação de grande valor: ela transplantou para os trópicos a antiguidade mediterrânea e mandou à Itália marcas das raízes da civilização brasileira. Isto já bastaria para desmentir a imagem de uma imperatriz apagada, silenciosa e ignorante. Essa imagem também acabou sendo criada por causa do caráter reservado de Teresa Cristina, traço percebido como “desinteresse”. Um equívoco.

CI – Na apresentação do seu livro, fala-se de um “temperamento forte que se impunha ao marido”.
AAA – Diz-se que era submissa ao imperador. Mas não é verdade e eu o mostro no meu livro. Uma mulher napolitana submissa não existe (risos).
Em cartas escritas pelas filhas, como uma assinada pela princesa Leopoldina, lemos que “minha mãe é muito mandona”, “quer que meu pai faça como ela diz, ainda que a Bíblia diga que a mulher deva ser submetida”. Frequentemente, a imperatriz escreve a Dom Pedro II, desculpando-se pelo seu caráter agressivo e pedindo perdão por tê-lo, possivelmente, tratado mal.

CI – Ela se expressava sobre fatos políticos como a abolição da escravatura e a proclamação da República?
AAA – Não muito, sempre por seu caráter enigmático e reservado, e não por falta de interesse. Quando deu-se a Abolição, o casal estava em Milão, e Dom Pedro II não estava bem de saúde. Ela mandou expedir um telegrama de felicitações à filha por aquela “grande ação”. Quando aconteceu a Revolta do Vintém, por exemplo, Teresa descreve a situação como “grave e pesada”, que “requer muita atenção”.

CI – Pode-se dizer que sua presença fortaleceu a cultura italiana no Brasil?
AAA – Ela representou um processo de forte aceleração da italianidade no país. Come mai no Brasil se criou a maior colônia italiana do mundo? As relações entre os dois países são fortes desde 1500, se citarmos Vespucci e Antonil, mas essa presença começa a assumir um caráter sistemático a partir da vinda da imperatriz. Escrevi um capítulo intitulado Teresa Cristina e a República italiana das artes no Rio de Janeiro. Ela cria uma verdadeira república de artistas italianos, com pintores e músicos, além de cantar e possuir uma grande cultura musical. Porém, na historiografia, esse fato é visto como um elemento folclórico. Ah todos os napolitanos cantam, então ela cantava também… Mas não é bem assim. Escrevo que, quando surgiu Carlos Gomes, o imperador queria que ele fosse estudar na Alemanha. Mas quem o enviou à Itália para estudar com Verdi? Esse fato mostra a importância de sua influência, visto o papel da música no processo de construção identidade nacional brasileira.  

Comunità Italiana

A revista ComunitàItaliana é a mídia nascida em março de 1994 como ligação entre Itália e Brasil.