Parceria inédita entre o Museo Egizio di Torino e o CCBB traz mais de 200 peças originais do tempo dos faraós para o Brasil, que há um ano perdia a maior coleção egípcia da América Latina
Desde o trágico incêndio que consumiu a maior coleção egípcia da América Latina, entre outros valiosos acervos do Museu Nacional da UFRJ, em setembro do ano passado, o povo brasileiro ficou órfão em matéria de Egito Antigo. Das 700 peças arrematadas por D. Pedro I no leilão de 1826, cerca de 200 foram recuperadas pelas equipes de arqueólogos, porém, sem previsão de serem expostas ao público. Por isso, a oportunidade de visitar a mostra no Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte é única. A mostra também reforça as relações em âmbito cultural entre Brasil e Itália: trata-se da primeira parceria entre o Museo Egizio di Torino (considerado o museu mais importante do mundo depois daquele do Cairo) e o CCBB. As 140 peças desta mostra vieram de lá. O diretor do Museo , o egiptólogo Christian Greco, ministrou uma palestra no CCBB-RJ sobre a história do local e o seu acervo no dia da inauguração, em outubro.
A mostra “Egito Antigo: do cotidiano à eternidade” concentra-se na vida, na religiosidade e no pós-morte da civilização que floresceu no Nilo, no período de 4000 a.C. até 30 a.C. São esculturas, pinturas, amuletos, objetos cotidianos, um Livro dos Mortos em papiro, objetos litúrgicos e estelas que contam aspectos da historiografia geral de forma didática e interativa. Além dos sarcófagos e de uma múmia humana da 25ª dinastia, as múmias de animais como gatos, peixes e crocodilos surpreendem o público.
“O principal fulcro é possibilitar a um público muito grande e diverso um entendimento qualificado sobre a cultura egípcia. Organizamos as obras em diversos recortes, diferentes instâncias, ultrapassando limites temporais e regionais”, explicou Pieter Tjabbes, junto com Paolo Marini, curador da mostra.
Em conversa com Comunità, o diretor do Museo Egizio di Torino, Christian Greco, revelou seu desejo de colaborar com a reconstrução do Museu Nacional.
“Encontrei o diretor do Museu Nacional há pouco mais de um mês, durante o congresso internacional dos museus, em Kyoto, quando falamos no mesmo painel. Espero que consigamos fazer algo juntos. Eu gostaria muito de colaborar, até porque o Museu Nacional tinha uma coleção egípcia importante que nos liga novamente à Itália, através do padovano Giovanni Battista Belzoni, que recolheu os objetos em suas escavações no Egito”, comentou, referindo-se ao explorador Giovanni Battista Belzoni, que escavou a Necrópole Tebana, atual Luxor, trazendo à luz as peças vendidas pelo comerciante Nicolau Fiengo. É a origem das peças compradas em leilão por D. Pedro I em 1826. Elas acabaram formando o maior acervo egípcio do continente. Anos mais tarde, tal coleção foi ampliada por D. Pedro II através de aquisições e regalos, a exemplo da múmia e do esquife da sacerdotisa e cantora Sha-amun-em-su, presente dado por um soberano egípcio ao imperador brasileiro, que a estimava a ponto de mantê-la em seu gabinete até a Proclamação da República.
O diretor italiano ressalta a importância de se valorizar o passado através dos museus para se compreender melhor o presente, apesar do imediatismo do “tempo real” que predomina na atualidade.
“É a primeira vez que temos essa colaboração, e é maravilhoso poder mostrar a cultura egípcia, essa cultura milenar, ao povo brasileiro. Eu espero intensificar essa colaboração para ajudar a fazer as pessoas entenderem a importância do passado em um momento em que o “presentismo” domina. Ou seja, fazer as pessoas entenderem que compreender o passado é a chave para compreender a nós mesmos. Somos o que somos porque chegamos até aqui através de um longo processo, e os objetos que sobreviveram, já que os homens não estão mais, nos contam uma história de quando foram criados e funcionavam nessa civilização. Estavam mortos, mas renasceram através das escavações. Espero realmente que esse seja o primeiro passo de uma longa e profícua colaboração”, resumiu Greco.
Confira as datas da exposição “Egito Antigo: do cotidiano à eternidade” no Brasil:
·CCBB Rio de Janeiro: 12/10/2019 a 27/01/2020
·CCBB São Paulo: 19/02/2020 a 11/05/2020
·CCBB Distrito Federal: 02/06/2020 a 30/08/2020
·CCBB Belo Horizonte: 16/09/2020 a 23/11/2020
Turin Papyrus Online Platform: os enigmas do Egito na palma da mão
O recém-lançado projeto do Museo Egizio di Torino, o museu egípcio mais importante do mundo fora do Egito, coloca à disposição de pesquisadores e do público em geral um vasto acerto com milhares de documentos da época dos faraós, incluindo 230 papiros, além de decretos reais, cartas e até o fascinante Livro dos Mortos.
“Esse projeto lançado há duas semanas é parte do coroamento de um trabalho de open access, open data, que começou há cinco anos, a partir da ideia, respondendo a um artigo novo da Constituição italiana, de que um museu deve se colocar a serviço da comunidade e dos cidadãos, no ato de conservar o patrimônio cultural mas, sobretudo, no ato de colocar esse patrimônio à disposição de todos. São 20 mil fragmentos que estão na plataforma que podem ser acessados por estudantes, por exemplo, que queiram estudar, elaborar suas teses etc”, relatou à Comunità o diretor do Museu Egizio di Torino, Christian Greco.
Os internautas que não se registrarem têm acesso livre a 54 papiros de um período que começa no Antigo Reino e vai até o período ptolomaico, entre textos funerários, literários e cartas. Já os usuários registrados podem visualizar um acerto mais amplo de 230 papiros.
Para ter acesso ao material, basta navegar no site do projeto.