Quem fica parado, está perdido. Matteo Renzi sabe muito bem disso. Ao demonstrar que quer pisar o acelerador do Palazzo Chigi, deixou a todos pasmos. Apenas dois meses após a vitória nas eleições primárias do Partido Democrático, que sancionaram sua nomeação a secretário da principal formação política de centro-esquerda da Itália, apunhalou o ex-premier pelas costas e deu vida a um novo governo. Porém, poucas semanas antes, ele havia declarado ter “plena confiança no presidente do Conselho de Ministros Letta”, e de não ter intenção de “liderar nenhum Executivo, sem antes passar pela legitimação do voto popular”. Mas, pelo contrário, após ter reunido em grande pressa a direção do Pd e blindado a sua relação, que conseguiu uma avassaladora maioria, obrigou Letta a se retirar do cenário.
— A direção do Pd agradece ao presidente do Conselho pelo importante trabalho feito na liderança do governo e pela significativa contribuição dada — disse Renzi.
Depois, o prefeito de Florença enfrentou o problema pela raiz:
— Queria evitar rodeios de palavras. Alguns disseram que estamos diante de um clássico de futebol, mas, na realidade, estamos em uma encruzilhada: por um lado temos o fechamento da legislatura e novas eleições, do outro, a transformação desta legislatura em constituinte, não há outros caminhos — ressaltou, para em seguida anunciar que “assumir responsabilidade de liderar a mudança é um risco, mas a disposição para correr este risco exige coragem”.
O jovem político finalizou seu discurso com palavras que liquidaram o governo Letta, que durou menos de um ano, e anunciou a “virada”, certo de que a ação de um governo como o vigente, paralizada pelos vetos cruzados, teria gasto sua imagem nas próximas eleições:
— Se a Itália pede uma mudança radical, ou esta mudança é expressa pelo Pd ou ninguém mais o fará. Peço a todos união para sairmos da estagnação — resumiu.
Mas não é só isso: Renzi pretende evitar eleições antecipadas, que prejudicariam bastante o partido, e aposta tudo na reforma eleitoral. Ao contrário do anunciado, não quer liderar um Executivo pífio até o término da legislatura. Tem em seus planos novas regras, o Italicum, no qual conseguiu um acordo com Silvio Berlusconi: trata-se de uma lei eleitoral que daria origem a um forte bipolarismo, e que eliminaria da cena política os partidos menores: ou vai, ou racha. Quer levar a cabo uma reforma de longa duração e grande profundidade e, quem ganhar, leva o pote. Renzi escolheu jogar sozinho esta partida. Não confiou na dupla Letta-Napolitano, sabendo que o presidente da República nunca teria dado fim ao governo sem ter conseguido a aprovação da reforma eleitoral, mas também sabendo que o primeiro-ministro nunca teria arriscado a sobrevivência política, ajudando, assim, o acordo entre Renzi e Berlusconi sobre o Italicum — um acordo que requereria o sacrifício do Nuovo Centrodestra (que seria posto de lado nos cenários políticos futuros pelas novas regras sobre pequenos partidos) e que teria, como consequência, a queda do Executivo.
Renzi deverá enfrentar problemas com a base no Parlamento
O problema na base permanece: depois da saída do governo de Forza Italia e com o Movimento 5 Stelle sempre na oposição, o governo Letta contava, como base, com os votos do Pd, mas também com aqueles de Scelta Civica, Fli, Udc e Nuovo Centrodestra, formação que reúne os divisionistas do partido de Berlusconi. Enquanto Letta era o líder, a ação do governo foi atrasada pela heterogeneidade das posições, e os mesmos problemas voltarão a ocorrer no futuro, visto que a maioria com a qual conta Renzi é a mesma, e as distâncias entre os partidos ficam iguais. Se, antes, os partidos menores estavam prontos a lutar para bloquear o Italicum, farão a mesma coisa nos próximos meses. Antes de enfrentar as eleições, o político fiorentino tentará aprovar alguma medida contra a casta política a ser usada em campanha eleitoral, e fará com que sejam aprovadas duas ou três intervenções a favor do trabalho, para demonstrar confiabilidade e consciência da situação, e irá enfrentar uma vez por todas o nó da reforma eleitoral. A missão é muito ambiciosa, principalmente com o Italicum, onde será complicado pôr de lado os aliados.
O revezamento no governo, enfim, parece ser uma ação perigosa, precipitada, que periga queimar Renzi, como já ocorrera com Massimo D’Alema quando decidiu entrar no lugar de Prodi. A operação que levou Renzi ao governo joga muitas sombras na imagem brilhante do homem da virada. Porém, mesmo não tendo feito nada ainda, já pode gabar-se de vários recordes: tornou-se primeiro-ministro sem nunca ter sido eleito no Parlamento e, com 39 anos, é o presidente do Conselho de Ministros mais jovem da história da Itália e, também, da Europa.
A passagem de cargos entre Letta e Renzi aconteceu em um clima glacial e, às vezes, surreal: por tradição, o político encarregado de formar o novo governo entra no Palazzo Chigi para receber, das mãos do premier em fim de mandato, o sininho, ou seja, o símbolo das reuniões do Conselho de Ministros. Letta não se absteve do ritual, mas nem olhou para Renzi: apertou mecanicamente sua mão e logo saiu apressado, com uma expressão aborrecida.