Ensaio geral da Expo 2015, Salão do Móvel de Milão recebe mais de 350 mil visitantes e presença brasileira faz sucesso
O Salão Internacional do Móvel deixou Milão com as portas e as janelas abertas para os milhares de visitantes. A quermesse mundial do design foi também um ensaio geral para a Expo 2015 que deverá receber 20 milhões de pessoas. Durante uma semana, os moradores e os turistas se misturaram aos arquitetos, aos comerciantes-lojistas e aos decoradores em busca de novidades para a vida de cada dia — urbana, campestre, alpina ou praieira. A criatividade, a cultura e o estilo italianos, mais uma vez, são e formam as forças motrizes de um setor com o qual todos devem fazer as contas, ou seja, aquele dos objetos que permeiam a existência da sociedade. E eles são tão importantes que, paradoxalmente, se presume que estejam ali, já faz tempo, muito tempo. Pequenos detalhes fazem grandes diferenças e ajudam, em uma casa, a refletir a personalidade de quem vive dentro dela. Os italianos são líderes mundiais no setor moveleiro. Ninguém, como eles, conseguiu atingir o grau de qualidade e de “diálogo” entre a criatividade do artesanato e a produtividade industrial em série.
A mente humana e as máquinas artificiais evoluem, projetam e constroem objetos para o uso cotidiano, numa sinergia que impressiona a concorrência e que serve de inspiração para seguir um modelo. E não existe um designer no mundo que não queira ou não gostaria de contribuir para a elaboração de um produto italiano. Não existe outro lugar no planeta no qual a excelência do know-how seja tão evidente e marcada, como se fosse uma identidade do DNA de um povo que deu à humanidade as invenções de um Guglielmo Marconi (telégrafo), de um Antonio Meucci (telefone), para não citar Leonardo da Vinci, Michelangelo e companhia, sem voltar ao tempo dos etruscos, primeiros habitantes da Itália antes de ser Itália. A lista é imensa.
Mas nem é preciso voltar tanto assim no tempo. Basta recordar que a zona de Brianza Monza, no norte da Itália, vizinha de Milão, considerada a capital internacional do design, possui a maior concentração de fábricas de móveis. O principal distrito industrial italiano foi a terra natal de empresas como Cassina, Zanotti, Molteni, Flos e Boffi, apenas para citar algumas. Monza é o baluarte e a maternidade deste setor por um único motivo: afinal, aqui está a famosa Villa Reale, um enorme palácio que foi a residência de caça da família real até a extinção da monarquia. A proximidade com este centro de poder fez com que muitos artesãos se mudassem para a vizinhança, como Lissone e Meda, e ali se instalassem para fornecer os móveis aos reais, ilustres e nobres habitantes. Marceneiros, pintores, artistas e iluministas criaram e cultivaram a celebração da forma e da beleza. Foram dois séculos de intensa atividade que lançaram as bases para os colossos presentes nos dias de hoje.
Os visitantes batem ponto aqui e se superam a cada ano. Nesta edição do Salão do Móvel, eles somaram 357.212 (em 2013, foram 324.093) — um recorde absoluto. A presença desta multidão reflete o reconhecimento internacional sobre o design italiano. Juntas, essas pessoas, incluindo cerca de três mil jornalistas, formaram uma legião estrangeira de 160 países. Na ponta do lápis, o Salão abrigou 2.400 expositores espalhados em uma área de 340 mil metros quadrados. Sem contar os 650 talentos eleitos pelo Salão Satélite, vitrine para os empresários e, até mesmo, curadores de museu de arte contemporânea atrás de qualquer criação mais artística, como revelou a idealizadora Marva Griffin.
Nunca se viu tanta gente em tanto espaço. Uma das áreas mais visitadas foi a mostra Casa Mia, no pavilhão da feira de Rho. Oito arquitetos de fama internacional, entre eles o brasileiro Marcio Kogan, gravaram depoimentos que explicam como vivem em suas próprias casas. A curadoria realizou vídeos que ilustram os ninhos, os cantinhos de nomes como o japonês Shigero Ban, a iraquiana Zaha Hadidi, o americano Daniel Libesking, os italianos Mario Bellini, Massimiliano Fuksas e a esposa Doriana, autores da feira de Rho, além do indiano Bijoy Jain/Studio Mumbai e do inglês David Chipperfield.
Geladeira fabrica sorvete e forno prepara alimentos em tempos diferentes
No salão principal, como ocorre a cada dois anos, as novidades do forno e do fogão — que se alternam com as do banheiro — foram destaque no conhecido Eurocucina. Centro e trinta expositores trouxeram suas novidades industriais e tecnológicas. Tudo em ritmo de aplicativos e interações entre o usuário e o eletrodoméstico, acionado e controlado à distância por telefones celulares ou outros dispositivos como tablets e computadores. Tudo ocorreu em nome do design e da segurança.
A cozinha, mais do que nunca, ganhou um lugar de destaque absoluto. Falta muito pouco para que os arquitetos comecem a construir a partir da cozinha. Ou seja, que tudo gire em torno do forno e do fogão. As capas para purificar o ar do meio ambiente são verdadeiras esculturas. Algumas parecem saltar da parede. Outras aspiram a fumaça diretamente da panela através de um sistema de corrente de ar transversal, ou seja, o fumo é sugado para baixo a partir de um exaustor instalado no meio do “cooktop”. Mas as novidades não param por aí. As principais marcas apostaram pesado na tecnologia mais do que em novos materiais. Agora, o tempo perdido na cozinha é praticamente nulo. A ideia de esquentar o forno pertence ao passado. O eletrodoméstico atinge a temperatura num instante e pode até mesmo ser usado para preparar alimentos com tempos diferentes, de uma só vez. As geladeiras também fazem sorvetes. E existem ainda as estufas caseiras, protótipos que permitem ao chef ter, durante todo o ano, temperos bons e frescos.
Rio + Design expõe peças de 50 profissionais
Como não podia deixar de ser, o Brasil marcou presença no evento. Com a atenção da imprensa internacional voltada para o país, devido à Copa do Mundo e aos Jogos Olímpicos, não foi difícil chamar a atenção para a produção local de design. Na badalada zona de Tortona, epicentro do Fuori Salone, um evento colateral que quase ultrapassa o principal em termos de público e de empresas participantes e que ganha vida própria e independência a cada ano, a Rio + Design expôs as peças de 50 profissionais, entre renomados designers e jovens emergentes de todo o estado do Rio de Janeiro. Leonardo Patago, Pedro Moog, Fernando Jaeger e Leo Eyer foram alguns dos nomes presentes no cenário criado pelo arquiteto Guto Índio da Costa, com cores quentes que lembram o pôr-do-sol na praia de Ipanema. Com o apoio da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio e Indústria, o design fluminense recebeu a visita de 30 mil pessoas que deram o ar da graça no espaço de 300 metros quadrados — o triplo dos primeiros passos, em 2009. Apex, Firjan, Sebrae-Rj e a Secretaria estadual de Desenvolvimento Econômico financiaram a exposição de cem produtos, de 50 designers.
— Esse grande número de visitantes representa uma vitória para nós. Milão é uma grande vitrine para o mundo e o Rio de Janeiro compareceu de modo impecável. A seleção dos produtos uniu qualidade e originalidade. Além disso, a cenografia era envolvente e de alto nível. Excelentes oportunidades já surgiram através de contatos entre designers e empresários do comércio e da indústria, além de convites para participar de feiras em outros países — declarou a subsecretária de Desenvolvimento Econômico do Rio, Dulce Ângela Procópio.
A seleção para trazer as obras a Milão levou em conta as características topográficas, visuais e sociais do produto e do produtor, ou seja, a atenção em traduzir em objeto o jeito do carioca, ou melhor, do fluminense, de ser e estar no mundo.