Cantores e bailarinos italianos gozavam de extrema popularidade na cidade, aclamados e admirados pelo público carioca
A relação entre a música italiana e o Rio de Janeiro sempre foi muito intensa. Na segunda metade do século XIX, a ópera desempenhou um papel importantíssimo. Foi pouco depois da transferência da Corte Portuguesa para o Brasil, em 1808, que a relação entre italianos e brasileiros no campo musical se intensificou. Muitos dos cantores da Capela Real vieram da Itália, sobretudo de Nápoles. Dezenas de castrati eram encarregados das vozes mais agudas das missas, pois, naquela época, a Igreja não permitia mulheres no coro eclesiástico.
— O clima da corte naquele período era fortemente embebido de italianidade. Não havia intelectual brasileiro que não admirasse este ou aquele personagem da música ou do teatro italiano — declara o professor de Literatura Portuguesa e Brasileira da Universidade de Roma Tor Vergata, Aniello Angelo Avella, apaixonado pela cidade que acaba de completar 450 anos, onde atualmente reside.
Nos teatros da então capital brasileira, apresentavam-se grandes cantores, músicos e atores italianos, em particular durante o Segundo Império, definido pelo escritor Marco Lucchesi como “um grande conservatório de música”, onde triunfava a ópera italiana, que “tornou-se símbolo de nacionalidade em construção”. De acordo com ele, o bel canto se identificava com a Itália de Bellini, Donizetti e Verdi — sem se restringir aos teatros. As notas das óperas italianas se ouviam também nas residências, pelas praças e ruas da cidade.
Graças à ajuda dos professores Lucchesi e Avella e dos livros Italianos no Rio de Janeiro, de Julio Vanni, e Deus abençoe esta bagunça, de Cléia Schiavo Weyrauch, ambos da Editora Comunità, enumeramos apenas alguns — entre dezenas — de músicos, cantores e atores italianos que conquistaram o público carioca ao longo dos séculos.
Gaetano Ricciolini (1778-1845)
Cantor lírico e bailarino italiano, pioneiro da ópera e da dança na América do Sul. Mudou-se para o Rio em 1817, a convite do diretor teatral e barítono milanês Michele Vaccani, a fim de integrar a companhia de ópera italiana do Real Teatro de São João. Em 1823, Ricciolini e a esposa Isabel foram membros fundadores dos Acadêmicos Filarmônicos, primeira associação para a realização regular de concertos de música na cidade. Além da ópera, o cantor foi responsável pelos primórdios do balé na América do Sul
Padre José Maurício Nunes Garcia (1767-1830)
O padre carioca escreveu a primeira ópera brasileira I due gemelli, jamais encenada e cujo texto em italiano, língua-mãe das óperas, perdeu-se. Além disso, há estudos dele para piano forte e num deles se encontra Il Barbiere di Siviglia, do compositor italiano Rossini.
Arcangelo Fiorito (1813-1887)
Napolitano, mestre de Capela Imperial até 1882, cantor, compositor e lente no Conservatório Imperial. Condecorado pelo rei com a Ordem da Rosa (1868), Fiorito compôs o Grande Hino Triunfal para grande orquestra, com vozes em honra das tropas que voltaram vitoriosas da Guerra do Paraguai. Além de professor de música e canto, atuava como empresário do ramo de importação.
Isidoro Bevilacqua (1813-1897)
Natural de Gênova, atuou como professor e pianista numa época em que o Rio era considerado a cidade dos pianos. Abriu também uma loja para vender partituras, pianos e harmônios. O filho Alfredo Bevilacqua seguiu os passos do pai e se tornou professor e pianista. Organizou, juntamente com Leopoldo Miguez, a Escola Nacional de Música.
Carlos Gomes (1836-1896)
O mais importante compositor de ópera brasileiro foi o primeiro a ter uma obra apresentada no Teatro alla Scala de Milão. Autor de numerosas canções em português e em italiano, foi agraciado por Dom Pedro II com a Ordem da Rosa e uma bolsa de estudos na Europa. O monarca queria que o compositor fosse estudar na Alemanha de Wagner, mas a Imperatriz napolitana insistiu para que fosse a Milão. Em 19 de março de 1870, noite de estreia da ópera O Guarani, que o imortalizou como compositor, recebeu os elogios até de Giuseppe Verdi, que teria dito Questo Giovane comincia dove finisco io.
Carlotta Augusta
Angeolina Candiani
(1820-1890)
Cantora lírica italiana, que se apresentou com grande sucesso nos palcos cariocas. Foi a prima-dona da Companhia Italiana de Ópera, estreando no Teatro São Pedro de Alcântara a Norma de Bellini, representada pela primeira vez no Brasil.
Gabriela Besanzoni (1890-1962)
Ilustre contralto italiana que estudou na Accademia di Santa Cecilia em Roma. Em 1918, se apresentou no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Sete anos depois, casou-se com o empresário brasileiro Henrique Lage, que mandou construir um palacete para a esposa no Jardim Botânico, que se tornou um cartão-postal do Rio: o Parque Lage.
Gioacchino Giannini (1817-1860)
Maestro toscano radicado no Rio, seu nome ocupava o cargo de mestre da Capela de Sua Alteza Real. Primeiro diretor da Academia Imperial de Música e da Ópera Nacional, ficou conhecido como o mestre de contraponto de Carlos Gomes. Possuía fama de temperamental e de não ter paciência.
Vincenzo Cernicchiaro (1858- 1928)
Violinista, compositor e musicólogo italiano. Autor do livro Storia della musica nel Brasile (1926), com relatos e críticas sobre a música popular brasileira. No Rio, participou de importantes iniciativas musicais, como o Club Mozart e o Club Beethoven, como violinista e regente. Foi docente no Instituto Benjamin Constant e no Instituto Nacional de Música. Tornou-se Patrono da Cadeira n. 27 da Academia Brasileira de Música.