A cidade italiana de Osasco, no Piemonte, é o ponto de partida para seguir rumo a Ostana, aos pés de uma das maiores montanhas dos Alpes italianos, o Monviso. O gigantesco triângulo de pedra domina a paisagem cinematográfica, do alto de seus quase quatro mil metros de altura. De carro, a subida pelas estradinhas sinuosas, em meio aos bosques e paredes rochosas, dura cerca de meia hora. O vilarejo de Ostana aparece depois da última curva de quase 180 graus, em direção ao céu. A subida íngreme cede espaço a um aclive cada vez mais suave, até um platô debruçado sobre o vale, ocupado por casas medievais.
Aparentemente, o povoado está desabitado, com poucos carros nas ruas e nenhuma pessoa nas calçadas deste burgo, com construções do século XV. A cidade parece ter sido abandonada às pressas, com gente fugindo de um cataclismo, talvez. Nada disso. Um olhar mais atento percebe o movimento no bar da rua principal e alguns turistas que procuram informações sobre os passeios naquela zona, ponto de partida para excursões rumo ao horizonte retalhado pelas montanhas.
Os residentes atuais são 80 pessoas, a maioria idosos. Em janeiro, a cidade comemorou o nascimento de uma criança. Ninguém nascia ali desde 1979. A jovem Silvia Rovere decidiu ter o filho na região porque quer oferecer uma infância à prole (o caçula foi o terceiro) em contato com a natureza.
— Aqui, todos se conhecem, algo impensável num prédio de uma cidade qualquer onde os vizinhos de um mesmo andar mal trocam duas palavras — diz à Comunità, diante da sua pousada La Galaberna.
A mulher, o marido e os dois filhos, já grandinhos, deixaram Turim para trás e se mudaram com malas e mamadeiras para Ostana, onde ela administra o hotel, logo na entrada do vilarejo.
O despovoamento começou durante o pós-guerra, com o processo de industrialização. Os moradores se transferiram dos pastos para fábricas e canteiros de obras nos distritos industriais das periferias das cidades. Para reverter este processo, a prefeitura colocou à venda 12 casas públicas que estavam desabando. Por 120 mil euros, podem ser compradas em bloco para uma futura transformação em hotel difuso, por exemplo. O valor é uma pechincha. A localização valeria por si só o preço a pagar, pois estão na porta de entrada do parque do Monviso.
— Esta não é uma operação de especulação imobiliária. Quem comprar as casa vai poder criar um empreendimento no ramo da hotelaria e ter a chance de acesso ao financiamento da União Europeia para a revitalização de antigas casas. Chegaram propostas até de empresários da Malásia. Naturalmente, o projeto arquitetônico deverá ser vinculante aos parâmetros das normas aprovadas pela prefeitura — explica o prefeito Giacomo Lombardo.
Por enquanto, portas e janelas dão para o vazio. Os tetos, com telhas de pedra, desabaram e levaram ao chão as velhas toras de madeiras com seus pregos de ferro batido. Tudo pode ser reutilizado, como os tijolos da época, recolhidos nos leitos dos riachos vizinhos. Espartanas, as casinhas continuam à espera dos novos donos. Várias possuem bebedouro coletivo para bois e vacas. Era comum habitar estábulos, principalmente na primavera, verão e começo do outono. As portas de entrada têm, apenas, entre 160 e 170 centímetros de altura. Quem vivia ali tinha baixa estatura e não contava com energia elétrica nem água corrente. Camponeses e pastores escreveram a história do lugar, palco de batalhas entre os partigiani e as patrulhas alemãs durante a Segunda Guerra. Nos arredores, foi abatido um avião de carga inglês que transportava mantimentos e material, lançados de paraquedas aos que combatiam o regime fascista.
— Os conflitos aconteciam naquela encosta. Os alemães rastreavam tudo por aqui. Quando foram embora, fizemos festa naquelas casas — afirma seu Pirot, aos 80 anos, lembrando-se muito bem daquele período tão marcante, ainda que fosse criança.
O sonho do prefeito de Ostana é atrair novos habitantes. Para isso, reformou um burgo medieval, vizinho ao centro. Estava tudo em ruínas. Com o financiamento da União Europeia e o trabalho de arquitetos e engenheiros do Politécnico de Turim, surgiu um novo burgo, moderno — mas com ares de Idade Média.