{mosimage}Festival de Cinema de Trento completa 60 edições e apresenta documentário que mostra o reencontro das novas e antigas gerações de trentinos no sul do Brasil
O festival de filme de montanha de Trento é um dos principais no mundo. O público pode ver de perto as aventuras em películas ou vídeos rodados quase sempre em condições extremas, nas mais variadas altitudes, longitudes e latitudes. O encontro de culturas, a superação dos próprios limites e os desafios contra a natureza selvagem são os fios condutores de uma semana de grandes emoções, dentro dos cinemas de Trento e de Bolzano. O festival completou 60 edições e mostrou que está em grande forma, com abertura para abraçar filmes de montanha que, em seu significado maior, espelha as formas física e metafórica.
Neste último caso, explica-se a participação do diretor Matteo Scotton com o seu média-metragem Live@Brasile, um documentário que revela, através da música, o reencontro das novas gerações do Trentino com os oriundi, descendentes dos imigrantes que chegaram ao Brasil no fim do século XIX e começo do XX. O filme foi incluído na seção Horizontes Vizinhos, uma janela aberta no festival para contar histórias globais com uma lente, um olhar local e dedicada aos autores do Trentino-Alto Ádige.
O filme dura 60 minutos e é a concretização do projeto Live@Brasile, cujo objetivo é promover o intercâmbio cultural entre o Brasil e a Itália através dos trentinos, aqui e lá. O filme é quase um on the road intercontinental, pois conta a experiência vivida por seis grupos musicais que viajaram para um tour de sete apresentações em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. O repertório vai do rock ao reggae, passando pela eletrônica. A viagem, os bastidores dos shows, as conversas entre os musicistas em dialeto e as perfomances dos espetáculos são os ingredientes deste “musical” trentino, uma ponte musical entre dois povos que possuem uma origem em comum. Com o apoio da associação Trentini nel Mondo e da sociedade Cooperativa Mercurio, além do financiamento da Província de Trento, o diretor Matteo Scotton festeja os 130 anos de imigração italiana e os 136 anos de imigração trentina no Brasil.
O relato a 24 quadros por segundo reúne cerca de 30 pessoas. Ele foi rodado ao longo de 2600 quilômetros, percorridos em duas semanas. Ao invés de emergir um documentário provinciano, revelou-se um filme global e contemporâneo, que nada tem a ver com a paisagem sonora do Trentino com a qual o mundo está acostumado a ouvir e a assistir, entre coros e composições melódicas. Dando voz e instrumentos à nova geração, o diretor construiu um eficiente canal de comunicação para veicular a mensagem de que a região italiana se espelha no passado de suas tradições, mas também sabe elaborá-las em versão moderna.
Entre uma apresentação e outra, os músicos trentinos participavam de palestras e conferências por onde passavam e tocavam. Tudo em nome da raiz trentina, fincada aos pés das dolomitas, mas com ramificações em todo o sul do Brasil. Eles visitaram Florianópolis, Porto Alegre, Bento Gonçalves, Sananduva, Luzerna, Curitiba e Presidente Getúlio.
Um dos pontos altos foi a viagem de 300 quilômetros entre Bento Gonçalves e Sananduva, no coração do Rio Grande do Sul, uma etapa que não estava prevista inicialmente. Florestas e campos de plantações de trigo dão as boas-vindas aos trentinos on the road. Tomando distância das cidades maiores, ao entrar na realidade do interior gaúcho, os integrantes das bandas trentinas reconhecem o ar caseiro, mesmo a 12 mil quilômetros do quintal de origem. Uma delegação de ítalo-brasileiros recebe os viajantes com grande calor humano e simpatia a dar e vender. Ali, na porta do ônibus uma senhora “oriunda” pede coro para a canção. À capela, todos embarcam na famosa Trem das Onze, de Adoniran Barbosa.
Momentos como estes se tornam inesquecíveis pela naturalidade e espontaneidade da gente local. E revelam laços de afeto tão estreitos entre os dois mundos que fica difícil não pensar que seja um só.
— O ar que respiramos lembra aqueles vilarejos perdidos da Sicília, de onde vem a minha família que migrou para o Trentino. Notei também uma senhora que se debruçou na janela, talvez atraída pelo som familiar daquela língua, o italiano — conta Anansi, ou melhor, Stefano Bannò, nascido em Trento, em 1989, filho de sicilianos.
Entre um churrasco lá e um café colonial ali, ele carregou as energias e as detonou no palco para delírio da plateia, junto com os seus colegas de aventura musical e cinematográfica.
— Estamos sempre acostumados a ver a Itália, a nossa terra de origem, como um lugar onde a musica coincide com aquela dos coros. Mas esta iniciativa nos permitiu mudar de ideia e nos ofereceu um mosaico da música jovem trentina. Os garotos são esplêndidos e nos deram um grande espetáculo. Espero só que eles tenham recebido tanta energia nossa em troca — disse o presidente do Círculo Trentino de Sananduva, Marino Lovato.
Tudo impresso em película, gravado através da sensibilidade do diretor Matteo Scotton, que soube transportar para a tela o objetivo maior da obra da sua sétima arte: Il Trentino per i Trentini nel Mondo. Dito e feito.