Comunità Italiana

Prisão produz doçura

Na Pasticceria Giotto, os presos da penitenciaria de Pádua aprendem as técnicas da arte da confeitaria e preparam deliciosas iguarias que são apreciadas até pelo papa Francisco

Na penitenciária Due Palazzi, em Pádua, os reclusos não passam seus dias apenas esperando o cumprimento da pena: trabalham e aprendem uma profissão que também vão poder exercer do lado de fora: pasticceri. Eles amassam e produzem panetone, colomba de Páscoa e outras iguarias, guiados por mestres confeiteiros que dão dicas para aprender a arte. A Pasticceria Giotto é a única confeitaria cuja sede fica dentro de um presídio. Desde que foi criada, em 2004, já recebeu vários reconhecimentos, entre os quais o prêmio de melhor pasticceria da Itália (2013); o prêmio da Accademia italiana della Cucina (2010); e o prêmio Gambero Rosso para panetone e colomba (2009).
A Officina Giotto já existia no início dos anos 1990 na casa de detenção da cidade vêneta. Primeiro, com um curso de jardinagem e depois com atividades artesanais. Em 2004, a associação aderiu a um projeto do Ministério italiano da Justiça para administrar a cozinha da prisão. Mais tarde, tomaram a decisão de transferir a própria confeitaria que produzia ótimos panetones e colombas para dentro da casa de reclusão.
— Desde então, a produção tem crescido muito. Somente em relação aos panetones, passamos de três mil para mais de 80 mil por ano — afirma à Comunità Nicola Boscoletto, presidente da Officina Giotto, a cooperativa que também se ocupa da pasticceria.
De acordo com ele, o começo foi difícil. Houve um forte debate no grupo, porém no final arriscaram e apostaram tudo na qualidade do trabalho e na excelência do produto.
— Os bons momentos foram muitos. Penso nos prêmios recebidos e nas visitas de muitas personalidades, mas eu prefiro citar um, muito recente, quando descobrimos que um dos nossos ex-trabalhadores, de nacionalidade albanesa, após voltar para o seu país, abriu uma pequena confeitaria — conta com satisfação Boscoletto.
Na pasticceria, trabalham 25 detentos. Nos momentos de maior produção, como Natal e Páscoa, esse número aumenta. A maioria, antes da detenção, não tinha experiência profissional. Boscoletto relata que o simples fato de ter que se levantar em um determinado horário, antes do amanhecer, vestir um uniforme e aprender um trabalho determina uma nova percepção do tempo.
— Os dias já não são marcados pela inutilidade e pelo tédio. Eles se redescobrem — explica o presidente.
Além disso, os trabalhadores ganham um salário que a maioria usa para dar sustento às próprias famílias, elemento de valor psicológico que representa uma “revolução da dignidade”, confirma o presidente da cooperativa.
Um dos detentos relata que, após o dia de trabalho, volta para o quinto andar, toma banho, janta, deita e não tem mais tempo de “pensar em coisas ruins e destrutivas como antes”. Na maior parte dos institutos penitenciários italianos, os presos não fazem atividades durante o dia. O resultado é que 70% deles, quando saem, retornam ao crime. No caso dos trabalhadores, esse percentual cai para uma faixa de 2 a 20%.
Os pasticceri de Pádua conquistaram clientes até fora da Itália: entre os consumidores mais fiéis estão o papa Francisco e o papa emérito Ratzinger, vários chefes de Estado, como o presidente dos Estados Unidos Barack Obama, que gostou muito do Noce del Santo, doce que experimentou no G8, na cidade de Áquila.
A experiência vêneta já tem discípulos em Chicago, Lisboa e até no Brasil.
— Visitamos a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, uma experiência social muito avançada em Minas Gerais, que administra mais de 40 presídios sem guardas e sem armas, capaz de recuperar realmente as pessoas — revela Boscoletto, que espera ampliar as colaborações no exterior. Para ele, nessa área, quando se aposta tudo numa pessoa e em sua capacidade de ressurgir através do trabalho, um mais um não fazem dois, e sim 100.
— Do compartilhamento com os amigos brasileiros, esperamos centuplicar os frutos — finaliza.

Os outros projetos da Officina Giotto
Além da Pasticceria Giotto, os detentos do Due Palazzi trabalham para outras empresas e atividades, como o call center da Illumia, provedor italiano de energia elétrica e gás; o call center para agendar exames no Ospedale di Padova; na montagem das bagagens da Roncato; na montagem de bicicletas em parceria com a Esperia; na digitalização de documentos em papel; na cozinha do presídio, onde se produz alimento para 900 pessoas e se preparam iguarias para hotéis, restaurantes e universidades.