Comunità Italiana

Receita de saúde e felicidade

Um dos principais legados que os italianos deixaram no Brasil foi o prazer da boa mesa. O respeito à qualidade e variedade dos ingredientes foi umas das dicas valiosas para alcançar qualidade de vida e longevidade. A cozinha dos italianos, marcada principalmente pela dieta Mediterrâneo, desembarcou de vez no Brasil e vem conquistando a preferência de muita gente. Para difundir essa dieta, especialistas italianos e brasileiros participaram do workshop “Nutrição positiva e educação”, na capital paulista.

Combine vegetais, legumes, frutas, peixe, azeite, cereais integrais e frutas secas. Depois se delicie, sem moderação, com esses ingredientes que fizeram a dieta Mediterrânea ganhar o mundo e o coração de médicos e nutricionistas. Não é à toa que essa combinação ostenta também o título de patrimônio cultural imaterial da humanidade pela Unesco. Para difundir os benefícios dessa dieta no Brasil e estimular hábitos alimentares mais saudáveis, o Consulado da Itália em São Paulo e a Commissione Nazionale Italiana per l’Unesco realizaram um workshop com professores das Universidades de Milão e Parma e especialistas brasileiros. O evento foi no dia 10 de abril, no Eataly, no bairro do Itaim em São Paulo, e contou com a apoio da Ferrero Rocher.  

Para o cônsul Filippo La Rosa falar da dieta Mediterrânea é falar da comida e do estilo de vida italianos que contribuem para o bem estar da população, considerada uma das mais longevas e saudáveis do mundo. “Algumas regiões italianas possuem uma história e tradição fortes na produção de alimentos, com uma forma de cultivar a terra e colher os alimentos muito própria que influencia a qualidade de vida. Falar da comida italiana não é falar de uma cozinha, mas de várias cozinhas que mudam de acordo com o território e a época do ano”.

O deputado Luis Roberto Lorenzato, representante da América Latina no parlamento italiano e da Frente Parlamentar da Amizade Itália-Brasil, foi um dos convidados do workshop e ressaltou a relevância do Brasil na produção de alimentos. A produção agrícola brasileira é responsável pela alimentação de 1,4 bilhão de pessoas no mundo e coloca o Brasil entre os três países que mais cultivam frutas e verduras no mundo.

A popularização da dieta Mediterrânea para outros países tem acontecido por meio de campanhas que difundem o valor nutricional dos alimentos, pesquisa, educação e implementação de políticas públicas. Para o professor Daniele Del Rio, da Universidade de Parma, o impacto dos hábitos alimentares na saúde é altíssimo.

Segundo ele, o que precisa ser observado é a relação entre o alto consumo de legumes, verduras, frutas e frutas secas com bons indicadores de saúde. E o contrário também acontece. Quando o consumo de proteína é exagerado os indicadores de saúde pioram. O especialista destaca ainda o valor da dieta Mediterrânea na prevenção de doenças cardiovasculares e degenerativas como a aterosclerose, alguns tipos de câncer e enfermidades de declínio cognitivo. O alto volume de moléculas antioxidante dos alimentos da dieta Mediterrânea ajuda na prevenção aos riscos e reduz os custos do país com saúde.

Demonização de alguns alimentos é um risco

Outro ponto abordado nessa apresentação foi o valor da estratégia de adaptação da dieta Mediterrânea para outros países. “Os alimentos de um país para outro podem não ser os mesmos, mas o que deve ser adotado é o conceito e a abordagem da dieta Mediterrânea. Para manter o prato balanceado e com propriedades terapêuticas, a dieta deve seguir o princípio da variedade e do conjunto do prato. Porque não existem super alimentos, existe super dieta que implica na combinação de vários tipos de alimentos”, explica Del Rio.

Como exemplo de adaptações bem sucedidas, o professor cita o caso da aceitação da dieta Mediterrânea na região dos Alpes Suíço. Além de países que possuem dietas semelhantes como a árabe e a dos países nórdicos.

O recado dos palestrantes várias vezes tocou num ponto de convergência que é a importância da dieta de inclusão de alimentos, em detrimento da dieta de restrição. Para a nutricionista Bianca Naves, a prática da demonização de alguns ingredientes não contribui para a formação de hábitos saudáveis e escolha de uma dieta balanceada. “Não existe alimento proibido. O que deve ser observado é o equilíbrio entre os diferentes grupos de alimentos e a variedade”, afirma. 

Arroz, feijão e brigadeiro de colher

Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Harvard, por exemplo, conclui que é impossível separar o ato de comer bem com o sentimento de felicidade. Para a especialista, é o momento de fazer as pazes com a comida e respeitar os sinais fisiológicos. Para simplificar seu pensamento, ela dá o seguinte exemplo: “É melhor saciar o desejo comendo um brigadeiro tradicional do que comer cinco brigadeiros feitos com casca de banana”. Essa recomendação, ela classifica como respeito aos sinais internos, ao comer intuitivo e à nutrição gentil.   

Para contextualizar a realidade brasileira e apresentar algumas mudanças de hábitos da população nos últimos anos, Bianca apresentou a pesquisa A Mesa do Brasileiro, realizada pela Fiesp/Ciesp no período de 2010 a 2017. O estudo aponta que a crise econômica trouxe novos contornos ao comportamento alimentar do brasileiro. Se em 2010, a escolha do consumidor pelo alimento seguia a hierarquia de critérios como marca de confiança, sabor e qualidade nutricional; já em 2017 a preferência era pela marca e sabor em primeiro e segundo lugar mas, na terceira posição, apareceu o quesito preço.

O mesmo estudo, no entanto, apresenta dados que sinalizam uma mudança positiva em favor de uma dieta mais saudável e equilibrada. O levantamento revela o aumento da preferência dos entrevistados pelo preparo da própria refeição que passou de 67% (2010) para 75% (2017). Assim como a opção pelo alimento industrializado caiu de 53% para 39%, no mesmo período.

O professor Andrea Poli da Universidade de Milão apresentou o neologismo “dieta Meditaliana” que define como a dieta Mediterrânea 2.0. Segundo Poli, além dos ingredientes básicos da dieta Mediterrânea, os italianos contribuíram com a inclusão de outros alimentos que complementam muito bem esse cardápio saudável. Como o café que reduz os riscos de infarto e o chocolate que, em porções de 10 a 15 gramas diárias, é um alimento que também traz muita proteção ao organismo.

Para Poli, Espanha e Itália são exemplos de países que conseguiram evoluir da prática da dieta Mediterrânea para a adoção de um estilo de vida mais saudável. “O conceito de nutrição é mais complexo. Não é só saciar a fome, é também praticar atividade física, manter uma convivência agradável no momento da refeição, acreditar na inclusão em detrimento da demonização de alguns alimentos e ter acesso a políticas púbicas que garantam o acesso ao conjunto dessas práticas”, defende.       

O professor alerta para o alto percentual de mortes causadas por doenças cardíacas, 40%, e metade desses casos é consequência de maus hábitos alimentares. Como o uso exagerado de sal, sódio, farinha refinada, açúcar, gordura hidrogenada, gordura trans. “Enquanto deveríamos escolher alimentos ricos em polifenóis, potássio, fibras, nitrato. O óleo de azeite, por exemplo, é muito rico em polifenóis e o seu consumo regular pode reduzir em até 40% a mortalidade precoce causada por problemas cardíacos”, explica.   

O professor da Universidade Federal da Bahia Hugo Ribeiro também fez uma apresentação abordando o papel social e cultural da alimentação. O especialista ressalta que principalmente a dieta Mediterrânea tem bastante influência nessa tendência de associar a comida com o prazer, a emoção e a convivência social.