{mosimage}Encontro em Paraty reúne pensadores em busca de um novo modelo de vida para o Brasil e o mundo, a partir de um sonho do italiano Domenico De Masi
Uma parte do sonho do sociólogo italiano Domenico De Masi foi realizada em Paraty (RJ). Na cidade histórica, intelectuais brasileiros e de outros países se reuniram no final de março para discutir sobre o momento atual da evolução do país em um diálogo sobre brasilidade. A reunião funcionou como uma espécie de brainstorm, onde pensadores como a psicóloga americana Susan Andrews, o antropólogo italiano Massimo Canevacci e o jornalista brasileiro Florestan Fernandes Jr. apresentaram suas ideias, muitas vezes colocadas em prática através de projetos.
A programação de Refletir Brasil, realizado pelo Grupo Oca e S3 Studium, partiu da premissa do autor de O Ócio Criativo, para quem a plenitude da existência só é atingida quando “o trabalho, o estudo e o lazer acabam por coincidir, acumular-se, exaltar-se, reciprocamente, combinar-se”. Além de conferências e debates, houve apresentações culturais, como o recebimento com dança no Quilombo do Campinho de Paraty, a Orquestra Mundana de Carlinhos Antunes, o show Eu Brasileiro, de Luís Pereque e banda, e a última noite com os Cirandeiros de Paraty, que percorreram as ruas caracterizadas pela típica calçada pé de moleque do século XVIII, arrastando participantes do evento e turistas que dançaram juntos e animados.
De Masi acredita que, na atual conjuntura, o maior país da América Latina é o que reúne mais condições para elaborar um novo modelo ao mundo. E não apenas por ser emergente, mas por ser democrático, ao contrário da China, e gozar de uma relativa paz interna e ausência de conflitos bélicos com vizinhos, problemas enfrentados pela Índia.
— Todo o mundo sofre com a falta de um modelo de vida. O Brasil sofre mais que os outros porque, por 450 anos, copiou a Europa e, por 50 anos, copiou os Estados Unidos, e agora ambos estão em crise. O país tem urgência para criar um modelo seu. E pode presenteá-lo ao resto do mundo. Como fizeram os iluministas — afirmou o professor de Sociologia do Trabalho da Universidade La Sapienza de Roma à Comunità no segundo dia do evento, ressaltando que o globo se transformou em um único “vilaggio”, onde não existe um “além das fronteiras”, pois sabemos “tudo de tudo no globo”.
Meio ambiente entre os temas de destaque
A sustentabilidade foi abordada pelo diretor de Coordenação e Meio Ambiente da Itaipu Binacional, Nelton Miguel Friedrich, que apresentou o Programa Cultivando Água Boa. O antropólogo da La Sapienza de Roma, Massimo Canevacci, que escolheu São Paulo para morar, dissertou sobre o conceito de diversidade criativa no segundo dia do evento. Já a mesa Educando pela escola e fora dela contou com Susan Andrews, embaixadora da FIB (Felicidade Interna Bruta) no Brasil. Ela expôs os indicadores que serviriam para medir o progresso social, como o bem-estar psicológico, o uso do tempo, a educação, a cultura e o meio ambiente.
No desfecho do encontro, De Masi estava mais otimista do que em seu início. Afirmou que já tinha a certeza de que o país é o mais apto do mundo a elaborar um novo modelo, mas que, depois desses três dias em Paraty, ao conhecer “tantas ideias interessantes”, passou a ter mais certeza ainda.
Ele deixou claro, porém, que a tarefa não pode seguir a lei do mínimo esforço.
— Um modelo não pode ser só econômico. Criar um modelo é extremamente complexo, é preciso criar grupos. As pessoas precisam estudar, esforçarem-se, para criá-lo — ressaltou.
Sobre o fato de o Brasil ainda sofrer com graves males sociais, que ele mesmo cita, como corrupção, analfabetismo, violência e metrópoles enormes e sem estrutura, onde o “tráfego é um inferno”, o pensador afirma que tais problemas não eximem da valorização dos aspectos positivos que o país tem, e outros não.
Estariam dispostos os intelectuais brasileiros a essa tarefa?
— Li muito sobre o Brasil, através de grandes escritores, quase todos mortos, como Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Hollanda. Estou procurando ler coisas novas, mas não encontro muito. Agora, não dá para avaliar se há intelectuais dispostos a fazer isso — avalia.
O próximo passo do Refletir Brasil é divulgar um manifesto baseado nas propostas discutidas, nas esferas econômica, socioambiental, cultural, educativa, comunicativa e tecnológica, entre outras. A intenção é que esse documento público possa ser utilizado para fundamentar ações de governos e empresas, além de servir de pauta a políticas públicas.