Restaurantes italianos em Roma, Milão e Asti trabalham pela inclusão social e empregam portadores de deficiência e detentos
Para boa parte das empresas, a inclusão de deficientes e outras pessoas marginalizadas pela sociedade é uma ideia muito bonita de se defender na teoria, mas intimidadora na hora de ser adotada na prática. Apesar dos desafios, três empreendimentos italianos têm-se destacado por abraçarem a iniciativa de uma forma poucas vezes vista antes. Esses lugares — um hotel e dois restaurantes — não se limitaram a preencher algumas vagas com portadores de deficiência ou a patrocinar uma campanha para promover a inclusão social de grupos marginalizados. Eles fizeram do emprego de deficientes e detentos o centro de seus negócios, provando que é possível abraçar uma causa social e oferecer um bom serviço.
O mais antigo deles é a Locanda dei Girasoli, uma trattoria e pizzaria fundada em 2000, em Roma, que hoje emprega mais de uma dezena de jovens portadores de deficiência intelectual. O restaurante foi aberto graças à iniciativa das famílias de jovens portadores de síndrome de Down, que desejavam assegurar um futuro profissional a seus filhos. Em 2012, por conta da grave crise financeira enfrentada pela Itália, quase fechou as portas. Para evitar o fechamento, em 2013, o empreendimento foi comprado pelo Gruppo Sintesi, um consórcio de cooperativas sociais engajado na inclusão profissional de portadores de deficiência.
A recusa em aceitar financiamento público é um dos pontos principais do projeto. Para os administradores da Locanda dei Girasoli, é importante que o restaurante seja capaz de se manter sem subsídios do governo, mesmo estando localizado em uma zona pouco central de Roma, no bairro de Quadraro, na zona sul da capital italiana.
Uma iniciativa parecida foi adotada pelos proprietários do Albergo Etico, em Asti, no Piemonte, que tem em seu quadro de funcionários jovens com síndrome de Down. A ideia de empregá-los surgiu em 2009, quando o proprietário do restaurante ligado ao hotel, Antonio De Benedetto, foi procurado pela Scuola di Formazione Colline Astigiane com um pedido para que empregasse Nicolò em um estágio em sua cozinha, para que o rapaz completasse sua formação e recebesse o diploma. O que deveria ser um estágio burocrático acabou se transformando em uma experiência enriquecedora para ambos os lados. Ao final do estágio, Nicolò pediu que a experiência temporária fosse transformada em um trabalho permanente. De Benedetto apoiou a ideia e assim nasceu o projeto do Albergo Etico.
No último andar do hotel, funciona a Accademia dell’Indipendenza, um espaço onde eles aprendem a viver de modo autônomo. Os mais velhos e experientes atuam como tutores dos recém-chegados. O mais antigo entre os tutores continua sendo Nicolò. Espécie de representante oficial do Albergo Etico, o jovem já apresentou o projeto no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no Quirinale, sede do governo italiano em Roma, onde conversou com o então presidente da Itália, Giorgio Napolitano, e no Vaticano, onde se encontrou com o papa Francisco.
Detentos da Milano Bollate preparam os pratos no restaurante InGalera
Não são apenas os portadores de deficiência que encontram dificuldades para se inserir no mercado de trabalho. A cooperativa ABC La Sapienza in Tavola, em parceria com a consultoria PwC, se empenhou no projeto da criação de um restaurante que empregasse detentos da Seconda Casa di Reclusione Milano Bollate, penitenciária localizada no norte de Milão. O InGalera é o primeiro e único restaurante da Itália a funcionar dentro de uma prisão e emprega atualmente nove detentos. Quatro trabalham no salão como garçons e cinco na cozinha, onde auxiliam o chef profissional Ivan Manzo e o maître Massimo Sestito, os únicos que vieram de fora da prisão. Cada prisioneiro recebe entre 600 e 1.200 euros por mês, de acordo com as tarefas. O cardápio não fica atrás das casas sofisticadas: inclui entradas como muffin de queijo pecorino e menta com creme de abobrinha, e pratos como tagliolini com camarões, erva-doce e limão caramelizado. De segunda a sexta, oferece um menu de almoço executivo, com primeiro e segundo prato por 14 euros. O projeto é resultado de um esforço da cooperativa que atua desde 2004 na penitenciária de Milano Bollate, sempre com o objetivo de manter a dignidade dos presos e facilitar sua reinserção na sociedade.