{mosimage}Mostra com documentos da Biblioteca Nacional prova que a trajetória das mulheres pela emancipação é antiga no Brasil
Trazer à luz dos brasileiros um Brasil oculto na história oficial — ainda que matricial em sua formação — é a proposta da exposição Brasil feminino, inaugurada no início de julho na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Inédita, a mostra reúne 150 originais ou reproduções de gravuras, manuscritos, pinturas, fotos, obras raras, jornais, revistas e documentos fonográficos que integram o acervo da Biblioteca Nacional. A partir das cenas coloniais em que são flagradas como escravas ou sinhás nas gravuras de Carlos Julião e John Luccock, o material apresenta as marcas deixadas ao longo dos séculos por mulheres de variadas origens e ocupações como as atrizes Ruth de Souza e Leila Diniz, a imperatriz Teresa Cristina de Bourbon-Duas Sicílias, a cangaceira Maria Bonita, a princesa Isabel, a compositora Chiquinha Gonzaga, as escritoras Cecília Meireles e Clarice Lispector e a mãe-de-santo e incentivadora do samba Tia Ciata. Entre as ítalo-brasileiras, figuram as atrizes Ittala Nandi e Fausta Polloni.
A ideia original de Brasil feminino era falar da presença feminina na política, contou à Comunità o curador da mostra, o historiador Marcus Venicio.
— Vimos que iria ficar muito fechado como tema. Então foi decidido que o mesmo seria ampliado à presença das mulheres na história em geral.
Nísia Floresta
Entre as dezenas de vultos trazidos à luz do público está o da escritora e educadora Nísia Floresta, pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto. Nascida em 1810, no Rio Grande do Norte, Nísia participou de campanhas abolicionistas e morou em países europeus nos quais publicou livros de crítica social. Algumas de suas marcas mais fortes ficaram na Itália, onde chegou a visitar o amigo Giuseppe Garibaldi. O lançamento no Brasil de um de seus livros, Três Anos na Itália, Seguidos de uma Viagem à Grécia, mereceu comentários de ninguém menos que Machado de Assis. Em sua coluna publicada no dia 10 de julho de 1864, no Diário do Rio de Janeiro, o escritor comentava que “Três anos na Itália parece ser o verdadeiro sonho de poeta”. Até que ponto a nossa patrícia se satisfaz aos desejos dos que a leram? Não sei, porque ainda não li a obra. Mas, ao julgar pela menção benévola da imprensa, devo acreditar que o livro merece a atenção de todos que prezam as letras e sonham com a Itália — compartilhava Machado com os leitores.
Longe de idealizar ou romantizar as cidades italianas, a obra é mais que um diário de viagem e se assemelha a uma crônica histórica, com uma análise do momento político vivido pelos italianos, no auge das lutas pela unificação do país. Ela descreve a situação política e econômica, os sentimentos populares e o clima revolucionário. Além disso, contém uma de suas críticas mais severas à escravidão no Brasil: Ó minha pátria querida, Éden desse mundo imenso e extraordinário, reaparecido ao olhar deslumbrado de Colombo, deixa, ah! deixa livremente explodir de teu nobre peito o grito humanitário, que sufocas penosamente, por força dos deploráveis preconceitos transmitidos por teus antigos dominadores de além-mar! Sê conseqüente com as instituições livres que te regem, com a religião que professas: quebra, oh! quebra os grilhões de teus escravos!”
Em outros livros, Nísia destacou a importância da educação feminina para a mulher e para a sociedade, a exemplo de Conselhos à minha filha, publicado em Florença em 1859.
A mostra Brasil feminino traz uma novidade para o público: a abertura aos sábados e domingos. — Desde o início do século passado, uma exposição na Biblioteca Nacional não permanecia aberta para os visitantes nos fins de semana — , revela o curador Marcus Venicio. A exposição está aberta à visitação até o dia 26 de agosto, no Espaço Cultura Elizeu Visconti, no primeiro andar da Biblioteca Nacional. A entrada é gratuita.
Anita Garibaldi lá e aqui
Por ser “heroína de dois mundos”, Anita Garibaldi, celebrada no Brasil feminino, também foi recentemente incluída em uma exposição italiana com o mesmo tema, Donne d’Italia la metà dell’Unità, que celebrou as mulheres destacadas na história da Itália, come Maria Montessori, Grazia Deledda, Elena Regina e Oriana Fallaci. A mostra ficou em cartaz de 16 de março a 26 de junho deste ano, no Palazzo Blu, em Pisa, e fez parte das celebrações pelos 150 anos da Unificação.