Uma gôndola para Hollywood

A 74ª edição do Festival de Veneza, o evento cinematográfico mais antigo do mundo, mais uma vez deixou um rastro de filmes que saem do Lido diretamente para outras premiações internacionais, especialmente o Oscar. O mexicano Guillermo Del Toro, vencedor do Leão de Ouro com The Shape of Water – em português A Forma da Água – já é, desde o último dia 9, quando ganhou o prêmio, o favorito à estatueta dourada.
Del Toro deve seguir o caminho de seus conterrâneos Alfonso Cuáron –(que abriu o Festival de Veneza em 2013 com Gravidade e ganhou o Oscar de direção um ano depois) e Alejandro González Iñarritú (também filme de abertura em Veneza, no ano de 2014, com Birdman, e vencedor do Oscar de filme e direção no ano seguinte). Mas ele não irá sozinho. Em uma das melhores seleções dos últimos tempos, Veneza apostou em filmes com temas sobre famílias dilaceradas, e acabou realizando uma surpreendente e impactante mostra.
O júri presidido pela atriz americana Annette Bening premiou os filmes mais aplaudidos do Festival, deixando de fora apenas dois que poderiam ter ganhado em algumas categorias. A Comunità, que acompanhou in loco todo o Festival de Veneza, lista as chances dos vencedores no Oscar, os motivos que levaram essas produções ao sucesso de público e crítica e quem saiu do 74º Festival de Veneza sem prêmios, mas ainda com chances à estatueta dourada.
Aos vencedores, o Oscar
A Forma da Água (The Shape of Water)
O realismo fantástico de Guillermo Del Toro, que foi unanimidade em Veneza, deve concorrer às principais categorias do Oscar. Visualmente perfeito, com trilha sonora que tem direito até a Carmen Miranda, o filme se destaca pelo roteiro – uma jovem surda que se encanta por uma diferente criatura – recheada de simbolismo, política e poesia. O elenco tem muitas chances em premiações individuais, especialmente a protagonista Sally Hawkins. Vale lembrar que Del Toro já chamou a atenção de Hollywood com O Labirinto do Fauno, de 2007, seu filme mais famoso até então.
Three Bilboards Outside Ebbing, Missouri
A outra unanimidade do Festival ganhou o prêmio de melhor roteiro para seu diretor e roteirista Martin McDonagh. A trama sobre uma mãe que luta contra a polícia de sua cidade para solucionar o assassinato da filha deve render, no mínimo, uma indicação ao Oscar para a protagonista Frances McDormand. Já o britânico McDonagh, que está em seu terceiro filme, deve ser o novo nome a brilhar em Hollywood, e maior aposta de Veneza entre os jovens cineastas.
Jusqu’ à la Garde
O filme do francês Xavier Legrand (conhecido por seu trabalho como ator no filme Adeus, Meninos, de Louis Malle) foi o último a ser apresentado em Veneza. A história do pai acusado de violência familiar que ganha o direito de visitar o filho caçula, que o detesta, conquistou público, crítica e o prêmio de direção para Legrand. É a estreia dele como cineasta e deve ser o indicado da França ao prêmio de melhor filme estrangeiro.
Hannah
O longa do jovem cineasta italiano Andrea Pallaoro mostrou uma tendência dos diretores do Belpaese em filmar em outros idiomas (neste caso, o francês). Deu certo para Pallaoro, que cativou a crítica com a história da mulher que é rejeitada pela sociedade por causa de um misterioso crime – e ainda rendeu a Coppa Volpi de melhor atriz para a veterana Charlotte Rampling, que deve disputar uma vaga entre as indicadas ao Oscar.
The Insult
Vencedor da Coppa Volpi de ator para Kamel El Basha , o filme libanês dirigido por Ziad Doueiri, que narra como um incidente pode gerar enormes confusões, deve ser o candidato do país ao Oscar.
Lean on Pete
O jovem ator Charlie Plummer ganhou o prêmio Marcello Mastroianni de revelação pelo longa de Andrew Haigh, onde ele interpreta um adolescente que cria um laço de afinidade com um cavalo. Vale lembrar que este prêmio foi dado a Jennifer Lawrence em 2009, quando a atriz, então com 18 anos, estreava no cinema em The Burning Plain, de Guillermo Ariaga. Ou seja: Hollywood já pode ficar de olho no promissor Plummer.
Foxtrot
O novo filme do israelense Samuel Maoz, que ganhou o Leão de Ouro em 2009 com Lebanon, traz outra vez uma trama de guerra. Levou o Grande Prêmio do Júri e coloca Maoz no caminho do Oscar de filme estrangeiro.
Sweet Country
O sangrento western sobre conflitos raciais, dirigido pelo australiano Warwick Thornton, ganhou o Prêmio Especial do Júri e pode render indicações ao Oscar aos veteranos Sam Neill e Bryan Brown.
Quem não ganhou, mas tem chances no Oscar
The Leisure Seeker
O aclamado filme do italiano Paolo Virzí era um dos favoritos ao Leão de Ouro. Falado em inglês, pode render indicações à estatueta dourada ao casal protagonista Helen Mirren e Donald Sutherland, as outras unanimidades deste ano em Veneza.
Suburbicon
A crítica social à sociedade americana não deu ao seu diretor, George Clooney, nem ao seu elenco, nenhum prêmio. Ator americano favorito de Veneza, Clooney deve ter melhor sorte no Oscar, onde o filme pode aparecer entre os indicados de roteiro original e também nos prêmios técnicos.
Pequena Grande Vida (Downsizing)
A ideia original do roteirista e diretor Alexander Payne – sobre pessoas que encolhem, aparentemente para ajudar o meio ambiente – foi bem recebida em Veneza, mas não o suficiente para ganhar prêmios. Se seguir a tradição de que filmes de abertura do Festival vão para o Oscar, Payne já tem vaga garantida.
Mãe!
O controverso filme de Darren Aronofsky – que já ganhou um Leão de Ouro em Veneza com o Lutador (2008) e foi presidente do júri em 2011 – chegou a ser vaiado na sessão de imprensa. Justamente por ter desagrado tantos, deve aparecer nas indicações técnicas do Oscar. A história do casal que tem sua casa invadida por estranhos também pode render prêmios a Michelle Pfeiffer e Jennifer Lawrence, duas atrizes sempre muito bem vistas pela Academia de Hollywood.
Mektoub My Love: Canto Uno
O outro longa controverso do Festival até pode dar ao seu diretor Abdellatif Kechiche uma indicação entre os filmes estrangeiros para o Oscar 2018 – vaga que parecia garantida após ele ganhar a Palma de Ouro em Cannes com Azul é a Cor mais Quente (2013). Naquela época, tudo que ele conseguiu foi um grande mal estar graças à acusação das protagonistas de que passou dos limites artísticos no set de filmagem. Dessa vez Kechiche usa não atores para contar o rito de passagem da adolescência para a vida adulta, uma trama que agradou tanto quanto desagradou, e é a maior incógnita pós-Festival