Comunità Italiana

Vestida de arranha-céu

{mosimage}Milão cresce no sentido vertical, ergue torres gigantescas e faz desaparecer bairros tradicionais

A transformação urbana da cidade ocorre a olhos vistos. A zona de Porta Garibaldi abre as portas para o céu. O skyline adquire contornos impensáveis até pouco tempo atrás. Os previstos 110 mil novos metros quadrados de construções já estão chegando ao fim. A torre Cesar Pelli — batizada com o nome do arquiteto argentino responsável pela obra — tem 231 metros de altura e quase toca as nuvens sob o céu da capital lombarda. Em dias de névoa e neblina, ela desaparece como por encanto. O ponto alto da mudança urbanística projeta a cidade para o futuro. Ela cresce verticalmente dentro da atual tendência de ocupar a menor quantidade possível de solo. Materiais de vanguarda e estruturas ecossustentáveis nortearam o projeto desde o começo.
O complexo residencial e comercial reúne um conjunto de edifícios de ferro e vidro moldados sob os conceitos modernos da bioarquitetura. Tudo abraça uma grande praça com cem metros de diâmetro, batizada de Gae Aulenti em homenagem à recém falecida arquiteta italiana, inaugurada no mês passado. Postes alimentados por energia solar iluminam este novo ponto de encontro dos milaneses. As casas e os escritórios futuros, já em fase de acabamento, super modernos, irão conviver com as antigas e resistentes casas de ringhiera, símbolos da arquitetura milanesa dos últimos 200 anos.
Tudo começa ou termina, depende do ponto de vista, ao redor da estação do metrô de Porta Garibaldi, ou no fim da famosa rua de corso Como, esquina com via Moscova. É ali que os criadores de tendências, os atores, as atrizes, as modelos e os jogadores de futebol marcam presença ao longo do dia e da noite. O burburinho mundano ganhou outra área de lazer. O novo espaço tem tudo para se transformar num lugar da moda — e não apenas no sentido literal da palavra, já que nas redondezas surge a “cidade da moda” durante a Semana de Design de Milão, de 9 a 14 de abril. Ele serve de “ponte”, ou melhor, de viaduto, entre o boêmio e artístico bairro de Brera e a zona de Porta Garibaldi.
O projeto completo de requalificação desta zona da cidade tem um custo de cerca de dois bilhões de euros. Atualmente, as construções realizadas e em curso formam o maior canteiro de obras da Europa. Os novos prédios envidraçados e modernos também estão na vizinha zona de Repubblica. Ali foi erguida a torre Diamante, com 140 metros de altura distribuídas por 30 andares. A geometria irregular do edifício realça os reflexos da luz e provoca os efeitos visuais semelhantes àqueles admirados nas pedras preciosas. Ela representa um luxo para a cidade de Milão em meio à violenta crise econômica que se abate sobre o país. Mas a modernidade tem um custo que não é apenas financeiro: cobra alto em qualidade de vida dos antigos moradores de Isola, um bairro típico milanês com casas baixas, agrupadas ao redor de um pátio interno. Com os vizinhos gigantes, uma boa fatia de luz solar, foi-se embora para sempre.
Os moradores do tradicional bairro Isola, mais do que nunca, se sentem,  literalmente, ilhados, uma vez que isola, em italiano, significa ilha, na sombra dos novos prédios. A tradicional zona habitacional, criada na virada dos séculos XIX e XX, foi assim chamada porque, na época, a área, separada do resto da cidade, ficava isolada de tudo pelos trilhos da ferrovia. Hoje, mais do que isolada, foi englobada pelo progresso e pelo desenvolvimento dos novos canteiros de obras que estão revolucionando o velho tecido urbano, principalmente sob a ótica da verticalização das novas construções do projeto Bosco Verticale, um condomínio residencial com prédios habitacionais altos e completamente cobertos com plantas. A sombra do futuro se projeta sobre o passado. Escurece as ruas, as casas de ringhiera, as pequenas oficinas dos artesãos. As enormes paredes de aço e de vidros de cristal espelham a transformação e a sentença, sem apelo, de desaparecimento da história do lugar, que será preservada apenas em imagens fotográficas e cinematográficas, textos e, principalmente, na memória de quem ali nasceu e viveu.