Quem perde mais com o preço dos vinhos?
O governo aumenta os impostos, os importadores e distribuidores aumentam os preços dos vinhos, os restaurantes dobram os valores para manterem suas margens, e o cliente… Bebe um vinho aquém do padrão dos pratos. Veem-se hoje restaurantes de alta gastronomia sacrificando seus pratos com vinhos de má qualidade, porém acessível ao bolso dos clientes. Essa diferença é mais gritante na razão direta da qualidade — e preços — dos melhores restaurantes. Ou seja, quanto melhor e mais cara a comida, maior o estrago causado pelo vinho ruim.
Praguejar contra vilões ou culpados não resolve o problema. Impostos e taxas são uma realidade do negócio e não se resolverão com lamúrias. As duas pontas têm que procurar uma solução ganha-ganha, que não se esqueça de beneficiar também o cliente. Lembrar-se da máxima aristotélica de que “a virtude está no meio”. Nesse caso, certamente também estará.
Os importadores e distribuidores alegam que suas margens estão no limite do sacrifício e não conseguem reduzir seus preços, e que o problema é a “ganância dos restaurantes, que colocam pesados sobrepreços”. De fato muitos vêm passando por apertos de liquidez, principalmente após a escorchante ST, a tal da Substituição Tributária, com a qual o governo passou a obrigar o importador a realizar a proeza de pagar o imposto antes de ganhar o dinheiro da venda da respectiva bebida. Para se adaptarem ao novo cenário, muitos importadores correram atrás de vinhos mais baratos de pequenos produtores e, assim como os distribuidores, adotam agressivas promoções online diretamente para clientes particulares. Alguns, hoje, contabilizam mais de 90% de suas vendas a essa carteira de compradores. Creio que isso seja uma sinalização importante para os restaurantes.
Por seu lado, os restaurantes alegam o inverso. Atribuem os altos preços praticados nos restaurantes aos “valores astronômicos cobrados pelos distribuidores”. Bom, o fato é que eu vejo uma variedade imensa de preço dos vinhos entre esses estabelecimentos do mesmo padrão de qualidade nas diferentes especialidades. Às vezes, passam do dobro. Para se ajustarem à realidade, os restaurantes hoje espremem vinhos mais baratos nas suas cartas minguadas em quantidade e qualidade. Os clientes, crescentemente, passam a levar o próprio vinho para terem um harmonioso equilíbrio nas refeições. Essa peça se encaixa perfeitamente no quebra-cabeça sinalizado um pouco acima.
Algumas considerações me ocorrem. Os importadores e distribuidores vendem a particulares por preços muito maiores do que os praticados para restaurantes. Isso é fato. Qual o espaço para repassar esse desconto para o cliente?
Quanto perde o restaurante quando o cliente leva o seu vinho e paga taxa de rolha? Pior: e quando não paga, o que tenho visto como prática com clientes habituais?
Há uma ausculta proativa entre importadores e restaurantes (e clientes também, por que não?) para otimizarem seus resultados frente às oscilações do mercado?
Os restaurantes têm percepção do impacto que vinhos de má qualidade sobre a comida podem lhes causar em médio prazo?
Enfim, quem fala aqui é um leigo, que pode estar atirando fora do alvo, deixando de ponderar vários considerandos, ser também longe de ver uma mobilização dos atores dessa cena dramática. Minha preocupação não é criticar, mas suscitar uma reflexão (em benefício próprio, também é verdade) sobre esse dilema que observo diariamente.